domingo, 21 de abril de 2013

Posicionamento do Codetem sobre o transporte fluvial no Marajó


 Foto: TV Liberal


Belém, 19 de abril de 2013.
Caríssimos,

O Colegiado de Desenvolvimento Territorial do Marajó – CODETEM – expõe neste resumo a sua opinião sobre a tragédia ocorrida neste dia, quando do naufrágio do barco Leão do Norte vindo de Chaves para Cachoeira do Arari.
Primeiramente desejamos expressar nossos sentimentos de solidariedade a todos àqueles que perderam entes queridos neste acidente, lançando nossa fé que as famílias sejam confortadas neste momento de dor.
Como marajoaras que somos, denunciamos ao Estado Brasileiro apenas uma das várias situações de não cidadania que tem passado historicamente nossa população: a da segurança e do direito de ir e vir em rios, igarapés e furos. Infelizmente nossa nação é feita de remendos e só quando acontece um fim trágico é que as autoridades resolvem atuar. Se for nesses momentos que existem ouvidos, ouça-se: é perigoso e é custoso andar por nossas estradas fluviais, principal meio de acesso das famílias de áreas urbanas ou rurais.
É revoltante depender de barcos sem condições de segurança, sem fiscalização, sem higiene e sem zelo com o meio ambiente; somos maltratados nas relações pessoais. Percebemos a falta de estrutura dos portos que nos servem. Viajamos em transportes lotados que enfrentam águas naturalmente agitadas. Se não o fazemos, ficamos isolados.
É assustador estar à mercê de piratas que sabedores da impunidade existente, roubam e pior, torturam e matam suas vítimas. Como não temos agências bancárias em nossos municípios, somos obrigados a andar com dinheiro na mão, por isso ficamos visados dia e noite em nossas viagens de barco.
Mas não é direito da população ter a liberdade de se locomover com dignidade? Para o marajoara historicamente a dignidade é um luxo.

Atenciosamente,

   

  Assunção Novaes

Coordenador do Núcleo Executivo
Colegiado de Desenvolvimento Territorial do Marajó- CODETEM


Às Suas Senhorias
Sr.  GILBERTO CARVALHO – CHEFE DA CASA CIVIL DA PRESIDENCIA DA REPÚBLICA

SR. SIMÃO JATENE – GOVERNADOR DO ESTADO DO PARÁ

sábado, 13 de abril de 2013

Qual O Manejo Florestal Comunitário Que Queremos – Parte III / Sobre os Centros de Treinamento


Imagem: Centro de Treinamento do IFT. Foto: Carlos Ramos


Belém, 13 de abril de 2013.

Caríssimos,

O ano de 2012 foi muito significativo para mim como revivência das bases em manejo florestal. E uma instituição me foi fundamental para o entendimento sobre os processos de exploração florestal madeireira de maneira responsável: o Instituto Floresta Tropical. Em 1997, quando pesava os saudosos 60 Kg e o IFT chamava-se FFT, tinha eu a esperança, esta verde como a floresta manejada, que em poucos anos seria possível colocar a Amazônia Brasileira em posição distante dos patamares perigosos de sobre-exploração de países como Indonésia e Tailândia.
Ano passado iniciei como consultor do IFT, debatendo temas como manejo florestal comunitário através das experiências que tive na ONG FASE no Marajó (especialmente Gurupá) e gestão florestal, esta graças à passagem que tive no IDEFLOR durante as ações de Gestão de Florestas Públicas (ordenamento Territorial de áreas como Mamuru-Arapiuns, Floresta Estadual do Paru e implantação das Concessões Florestais Estaduais). Foram grandes aprendizados e algumas constatações, a maioria motivadora.
No entanto, cheguei à conclusão melancólica que a qualidade do manejo florestal praticado no Estado do Pará e do Amapá é péssima. Ok, os debatedores da engenharia florestal dirão que disse o óbvio e nada acrescentei na frase dita. Mas senhores, talvez se houvessem mais centros de treinamento em manejo florestal na Amazônia, mais gente haveria para criticar àqueles que fazem garimpo madeireiro, sem preocupação com o futuro, sem técnica, sem zelo, imediatistas e selvagens capitalistas que são.
No período que passei no Centro de Treinamento do IFT, na Fazenda Cauaxi, em Paragominas, percebi não somente a importância de demonstrar a técnica para o menor dano possível na floresta: entendi o ambiente de trabalho que ali havia. Vi o processo continuado, com objetivos, visão e metas que nos fazem assimilar realmente o quão é importante aliar a engenharia com o valor da mata, dos rios e das pessoas. E muitos visitam este centro todo o ano.
Uma coisa que me deixava encucado a cada vez que saia do centro de treinamento é o porquê não haver mais destes centros. Se tantos passam por lá, inclusive técnicos de entidades governamentais que tem a responsabilidade de promover a conservação dos recursos florestais e elogiam o muito que aprenderam, qual o motivo de existir apenas um centro deste tipo ao juntar-se Pará e Amapá? Será que não existe demanda? Será que o problema institucional do manejo florestal está resolvido?
Um não seria a resposta. Ao estudar o Amapá, imaginei os muitos milhões de reais perdidos nos assentamentos de lá por não ter-se conhecimento das técnicas para as florestas locais e o quanto ela vale minimamente. Em Portel, no Marajó, quantas áreas ficaram inviabilizadas pela falta de cuidado. Muita madeira desperdiçada. Muitas árvores derrubadas a esmo. Muitos igarapés acabados pela falta de uma boa estrada. Muito estrago na serraria. Como pode ter a macacaúba estar sumindo das várzeas estuarinas? Como pode ter tanta gente desconfiada do manejo florestal? Mas esta pergunta é fácil de responder: porque só vimos meio-manejo ou nada-manejo. Vimos exploração florestal licenciada, porém, não planejada em longo prazo. “Eu só quero garimpar você, floresta, não quero saber se vais recuperar”, quase diriam alguns.
E não faltariam áreas para estas escolas da floresta. Unidades de Conservação. Florestas Nacionais. Até Decreto de Destinação para Centro de Treinamento já existe. Mas não sai do papel. Sem conhecimento dos detalhes da exploração madeireira com impacto reduzido, como pode um engenheiro ou engenharia comprar uma briga pelo manejo florestal com a qualidade necessária a derrubar as teses em que o dinheiro vem em primeiro lugar.
Pelo fato das maiores ofertas de áreas florestais estarem na posse de comunidades tradicionais, fruto de um trabalho incansável da sociedade civil pela segurança da terra, o assédio tornou-se perigoso. Se considerarmos que muitas madeireiras que hoje tentam uma relação com comunidades regularizadas são vindouras nesta constatação de má qualidade do manejo, passar-se-á a prática adiante. Não gostaria de ver pessoas que tanto protegeram a floresta deixarem uma firma derrubar madeira em sua região de forma bagunçada por falta de entendimento técnico. De quem é a casa afinal?
A educação é sempre a salvação. São nas suas ferramentas que saberemos usar e manter a floresta em pé. São em escolas da floresta que iremos aperfeiçoar nossas técnicas de intervenção.
Uma sala de aula sobre manejo florestal não deveria ter tijolos e forros de PVC. Deveria ter árvores como paredes e um céu azul como teto.


Imagem de treinamento do IFT. Foto: Carlos Ramos