terça-feira, 19 de julho de 2016

Lamberto, o Traumatizado: Escola Sem Partido

Lamberto, o Traumatizado, estava na mesa do jantar reclamando de sua filha Shana (outra traumatizada) para que esta prestasse atenção na sua netinha, Maria Aneci, e parasse de zapear. "Desculpa pai, tava lendo esse negócio de Escola Sem Partido que pode virar lei. Tá certo! Chega de Comunistas nas escolas!".

Enquanto lavam a louça, Lamberto pergunta para Shana: "Filha, o que você sabe sobre o descobrimento do Brasil?". 

"Ora, que Pedro Álvares Cabral descobriu o Brasil. Tá no livro".

"O que avistou?". 

"O Monte Pascoal". 

"Onde?".

"Onde é a Bahia atualmente".

"E se eu te contasse que o Brasil foi primeiramente visitado pelo espanhol Vicente Pinzón, em fevereiro de 1500, passando pelo Marajó onde hoje é Joanes... É sério, tem registros... Antes ainda, em 1498, segundo documentos oficiais, por um militar português chamado Duarte Pacheco, aportando em uma área que os historiadores dizem estar entre o Maranhão e o Pará".

Lamberto mostrou alguns livros e reportagens a respeito.

"Olha só... não sabia...".

"E agora? O que farás quando alguém te falar de Pedro Álvares Cabral?".

"Falarei que não é bem assim, que é historicamente justo falar também em Duarte Pacheco chegando no Pará-Maranhão (rsrsrs) ou Vicente Pinzón chegando no Marajó".

"Humm, olha só, você tomou partido, o partido da verdade! E se tu fosses uma professora de História, omitirias a tua opinião fora do senso comum dos livros didáticos?".

"Claro que não, se eu sei onde pode estar a Verdade!".

"Vai se posicionar?".

"Vou".

"VOCÊ ACABA DE DESCUMPRIR A LEI NACIONAL DE ESCOLA SEM PARTIDO!! VOCÊ TEM O DIREITO DE FICAR CALADA E TUDO O QUE VOCÊ DISSER SERÁ USADO CONTRA VOCÊ NOS TRIBUNAIS. OPS! VOCÊ JÁ DISSE! GUARDAS! LEVEM-NA PRESA!".

"Mas isso não é justo!!". 

"PENA MAIOR TENS POR GRITAR 'NÃO É JUSTO' NA FRENTE DOS ESTUDANTES!"

Fez Lamberto gesto com o cinto como se fosse uma forca.

"Caramba, pai, que coisa... que brincadeira sem graça...".

"Entendeu?".

"Entendi".


E continuaram calados a guardar a louça...







Sem Traumas.






quinta-feira, 7 de julho de 2016

Pretensão de traduzir gráficos: Precariados, Uni-vos! / PARTE 3 - FINAL

“Quando se propõe uma visão da natureza unicamente como objecto de lucro e interesse, isso comporta graves consequências também para a sociedade. A visão que consolida o arbítrio do mais forte favoreceu imensas desigualdades, injustiças e violências para a maior parte da humanidade, porque os recursos tornam-se propriedade do primeiro que chega ou de quem tem mais poder:
O vencedor leva tudo...”
Laudato Si/ Encíclica do Papa Francisco I.



Belém, 06 de julho de 2016.
Caríssimos e Caríssimas,


     Os três escritos elaborados aqui em desfecho foram pretensiosos em tentar analisar a Dívida Pública Brasileira e suas implicações na nossa vida.  Nem de longe sou especialista no assunto, por isso, peço perdão se registrei algo indevido. Contudo, sou curioso e sei ainda indignar-me. Não sinto raiva, o que não ajuda neste mundo já tão conturbado e sim, ressalto, uma altíssima indignação que me mobiliza a não aceitar e agir sobre esta situação. Por isso minimamente escrevi sobre o tema na tentativa de despertar também alguma curiosidade.


     Vejam o gráfico abaixo, por obséquio:





O estranho globo acima resume os estudos de matemáticos que concluíram sobre a rede capitalista que domina financeiramente o mundo[1]. De acordo com a pesquisa de 2011 (porém bastante atual, dada a manutenção e agravamento da concentração de renda no planeta entorno de poucas pessoas e empresas), envolvendo 43.000 empresas transnacionais, concluiu-se que um pequeno número delas tem um poder desproporcionalmente elevado sobre a economia global. Tudo isso num respeitável banco de dados que possui 37 milhões de empresas e investidores.

Das 43.000 empresas transnacionais, 1.318 detêm um controle sobre a economia real que atinge 60% de todas as vendas realizadas no mundo todo. E destas, dão as cartas somente 147 empresas (a maioria bancos). É fácil imaginar que algo está muito errado, confirmado pelas investigações da OXFAM de que 1% da população detém a mesma riqueza que os 99% restantes[2].

E é isso o que somos, os restantes. Os precariad@s.

Não! Não seremos. Recuso-me!

Teremos a Clarividência de Milton Santos!

A Certeza Educacional de Paulo Freire!

A Dimensão do Local de Edgar Morin!

A Coragem do Papa Francisco!

A Atitude de Zilda Arns!

A Perseverança de Vandana Shiva!

O olhar de um outro mundo possível no rosto dos estudantes que acordam!

Não seremos mais precariados.

Nem restantes.

E sim humanos.

Vida. 

Amor.

Justificáveis.

Então levante a cabeça, mano.

Levante a cabeça, mana.

Levantemo-nos.




Carlos Augusto Ramos


Pretensão de traduzir gráficos: Precariados, Uni-vos! / PARTE 2

“A gente não quer só comida
A gente quer comida
Diversão e arte
A gente não quer só comida
A gente quer saída
Para qualquer parte...”.
Comida/Titãs.


Belém, 06 de julho de 2016.

Caríssimos e Caríssimas,

          Eu lembro. Lembro bem. Do menino que brincava com ossinhos de boi morto da fome do sertão nordestino[1]. Cada ossinho uma vaquinha, um bezerrinho, quem sabe uma cabra, sabe lá a imaginação de uma criança e seu escapismo naquela miséria toda. Era necessário combater a fome no Brasil, propalava-se e convenhamos, quem poderia fazê-lo sem timidez? Mandatários como Fernando Henrique Cardoso, aquele que ainda sonha em ver George Washington na cédula de real? Antes dele, só discurso. Com ele, também discurso, atenuado, bem verdade, pela estabilização da moeda (em contrapartida, a rapinagem no patrimônio público brasileiro). Eu me lembro. Antes disso, comprava pão com novidade ruim no preço a cada semana. Porém, enfrentar a fome de verdade, ser audacioso em planejar o fim dela, enfrentar esta mazela na prática, somente a partir da presidência de Luís Inácio Lula da Silva.  Você até pode ter ódio do PT nessa confusão toda midiática a embaralhar o cérebro, porém não podes negar que este resultado histórico coincide com a gestão de Lula.


      Muito mais poderia ter sido feito para finalmente colocar o Brasil no patamar consonante com suas riquezas naturais e população miscigenada e diferenciada. Infelizmente, não se logrou outros êxitos fundamentais. Vejam o gráfico abaixo:
    
    

Para nós que fomos incautos, não percebemos que enquanto se crescia o atendimento da previdência e assistência social, a dívida pública galopava pro alto, em valores muito maiores, suas taxas de juros, suas amortizações. Sinal que o Banco Central tem decidido sozinho este caminho, com a fraqueza das esferas executiva, legislativa, judiciária em monitorar responsavelmente o processo. Aliado a este quadro, um Quarto Poder (Grande Mídia) realizando com sucesso sua estratégia de isolar o problema de tal forma que pareça que ela não existe, tal qual age em relação a Aécio Neves em 2016, não obstante o óbvio de suas nefastas ações de poder[2]. São décadas em que a sociedade ficou alienada da situação da Dívida Pública Brasileira e suas migalhas para as áreas de saúde, educação, saneamento, cultura e fortalecimento das próprias instituições governamentais.

O avanço na educação enquanto acesso à universidade pública pelos menos favorecidos foi notável, mas poderia ser maior segundo o gráfico. Todas as escolas brasileiras de ensino fundamental e médio seriam exemplares na América Latina. Agora eu sei.

A liberdade de expressar-se culturalmente a partir da redemocratização (?) é uma realidade, porém, agora sei, poderia ter maior apoio certamente. O que faria do filho do menino que brincava com ossinhos (se puxou pro pai a veia artística), um estudante em artes cênicas. Sei que poderia se a sociedade fosse senhora minimamente dos orçamentos.

As agências de assistência técnica seriam tão bem estruturadas e capazes que a agricultura familiar, por exemplo, seria mais destacável e dinâmica do que já é em alimentar nossas famílias. Sei que assim seria.

Se eu precisasse ir a um posto de saúde, ali teria a dignidade de ser bem atendido, numa condição em que entenderia meu mal segundo a explicação do médico atencioso. Ficou somente o sopro daquilo que ensinam os cubanos em sua medicina participativa[3].

De exorbitante e fato corrente foi a alta lucratividade bancária. Não é possível esconder esse absurdo. Saber e omitir tal informação é um ato de negligência que beira a corrupção.

 


Bancos, lucros, Wall Street, especulações maravilham George Soros, o ultra-mega-investidor-predador, pai intelectual de pessoas como Armínio Fraga e Pedro Parente, parceiros temerários da atual interinidade na presidência que não esconde a intenção de diminuir direitos conquistados nesta já injusta batalha. Serras e Motosserras a serviço do empobrecimento de um país inteiro por gerações, cuja a atual sucumbe na violência dirigida aos jovens da periferia. Não dá pra dizer agora que o Estado não tem culpa desta mortandade.

Enquanto isso, nós vivemos precariamente em nossas quase vãs políticas públicas. Alienados? Só que não.   


Precariad@s, Uni-vos!!



Carlos Augusto Ramos



quarta-feira, 6 de julho de 2016

Pretensão de traduzir gráficos: Precariados, Uni-vos! / PARTE 1

“Ô Josué, Nunca Vi
Tamanha Desgraça
Quanto Mais Miséria Tem,
Mais Urubu Ameaça...”.
Da Lama Ao Caos/ Chico Science & Nação Zumbi.


Caríssimos e Caríssimas,

A escrita nada mais é do que uma tradução, diria José Saramago. Se o mestre literário está correto, então é dever de cada um que costuma redigir ser intérprete das bem-aventuranças do mundo e das perversidades escondidas nas cortinas belamente estampadas pelas estruturas humanas ignóbeis. Do que é singelo e expoente da Criação eu diria que é mais fácil a espontaneidade de declamar poemas, tecer prosas, narrar épicos, pois basta olhar a vida e sua plenitude original e se sentir contagiado em desenhá-la pelo ato de escrever. Por outro lado, denunciar o absurdo feito por nós mesmos nos alicerces construídos de injustiça globalizada é algo desafiador, talvez devido à esquisitice a priori de reclamar de nossa própria condição e ação humanas, pois não era para ser assim.   

Neste exercício que faço sobre a perversidade, caiu-me como uma luva os estudos da ONG Auditoria Cidadã sobre a Dívida Pública Interna Brasileira, que me fizeram atentar basicamente para 4 gráficos (neste texto exponho um deles) por ela produzida e deste modo, vi-me impelido a escrever pretensiosamente como um analista do assunto, sem ser economista, sem ser sociólogo e sim um mero cidadão, sem plano de saúde, andante de ônibus, com casa financiada, sem emprego fixo, porém com muito trabalho (Graças aos Céus!). Nem luxento, nem com luxo, mas com um lar digno na medida do possível e ciente das vicissitudes de uma parcela significativa da população. Estaria sereno na minha situação medianamente brasileira se não fosse o gráfico abaixo: 






























Apesar dos últimos cálculos feitos pelos pesquisadores da ONG Auditoria Cidadã serem de 2014 sobre os percentuais da destinação do orçamento da União, é perfeitamente possível relacionar nossos dias atuais com tais números, mesmo porque a metodologia não se modificou e os sinais temerários apontam para o seu agravamento. Então traduzindo: 45% (quase metade) de tudo o que o país previu em seu orçamento em 2014 foi para pagar a dívida pública. É a dívida pública aquela contraída pelo Tesouro Nacional para financiar o déficit orçamentário do Governo Federal, nele incluído o refinanciamento da própria dívida, bem como para realizar operações com finalidades específicas definidas em lei[1].  Ou seja, se o Governo não arrecada o bastante para honrar seus compromissos, empresta dinheiro, na maior parte das vezes, dos bancos privados. E aí que mora a perversidade.


“Mas ora, se emprestou, tem que pagar”, alguém poderia dizer. Tudo bem, se não fosse o fato do próprio Banco Central controlar estes juros nos empréstimos feitos, diga-se de passagem, um dos maiores a nível mundial. Isso quer dizer que quem determina os juros a serem cobrados é o próprio devedor, sempre a favor daquele que empresta! Uma agiotagem ao contrário! E pior, numa relação de juros sobre juros, conforme denuncia Maria Lúcia Fatorelli[2] chamada tecnicamente de anatocismo, coisa de mercado em cima de orçamento público voltado para e pelo povo (desculpem a redundância envolvendo as palavras “público” e “povo”, só que nem tenho certeza se ainda o é). Para concluir que somos dominados por ímpios neste sistema, quem vota nessas reuniões são quase que exclusivamente, representantes do próprio mercado financeiro que detém a imensa maioria dos títulos da dívida[3]. Então tá explicado porque a taxa de juros não baixa...


A precarização do atendimento à população fica desta maneira em seus restos repartidos:

Quase 4% para a saúde; e eu não tenho plano de saúde.

Quase 4% para a educação; e tu não tem educação pública de qualidade.

Quase 3,5% para o Trabalho, e ele está desempregado.

Nem 10% para estados e municípios; e nós todos sofremos.

Nem 0,5% para a segurança pública; e vós temeis a ameaça do tráfico na sua porta.

A miséria de 0,02% para o saneamento básico; e eles pisam em vermes (desgraçadamente não nos vermes que mereciam ser pisoteados).

E culpam a previdência (21,76%) pelos maiores gastos, numa campanha midiática desde que me entendo como gente que os cortes devem ser imediatamente realizados nesta área, que se lasquem os aposentados e pensionistas.

Bem dissera o filósofo Zygmunt Bauman: “Os governos vivem presos entre duas pressões impossíveis de reconciliar: a do eleitorado e a dos mercados. Eles têm medo de que, se não agem como as bolsas e o capital móvel querem, as bolsas quebrarão e o dinheiro irá a outro país. Não se trata apenas de que possa haver corrupção e estupidez entre os nossos políticos, mas sim que essas situações os deixam impotentes...”[4].

Para os incautos, é simplório culpar somente o presidente/presidenta, o executivo nestes erros de décadas. Até poderia ser aparentemente justo essa acusação, pois dele (o executivo) deveria haver a iniciativa de esclarecer a real condição do país. Sequer nos informam que o legislativo sabe também do problema, aprovando essa velhacaria institucionalizada, com não poucos parlamentares lucrando por fora com esse esquema. Assim, não cobramos de nossos congressistas por desconhecimento. Do mesmo modo, se soubéssemos em bom contingente de cidadãos e cidadãs, iríamos pressionar nosso supremo judiciário federal vendado e anestesiado diante dessa roubalheira, uma preguiça que vira coelho quando o assunto é beneficiar a própria esfera[5]. Aí o Banco Central faz o que bem quer. Aí bate palmas o coringa, o Quarto Poder, a Grande Mídia, os relações públicas dos Grandes Bancos e dos Magnatas. Não, senhoras e senhores, a propaganda está redondamente errada: isso não muda o mundo...

O resultado final é que eu, tu, ele, nós, vós, eles, somos impactados pela precarização do bem-estar social, ambiental e econômico por conta de um sistema perverso do capital, globalizado quando lhe é conveniente, mas altamente concentrador, coerente com o objetivo que detém o capitalismo: chegar ao cúmulo de si mesmo.



Então, Precariad@s, Uni-vos!!



Carlos Augusto Ramos