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domingo, 1 de julho de 2018

Crônicas, Passageiro: Tempo Teu

Belém, 28 de junho de 2018.
 
         Fui a Paragominas. Voltei no mesmo dia. Naquelas sete da noite subira no ônibus uma senhora cheia das sacolas, em cada dedo sofrido um saco com frutas. Sentou-se no meu lado, uma das primeiras poltronas.
         - O senhor quer maracujá? – Ofereceu talvez porque fosse generosa, talvez porque queria se livrar de uma daquelas sacolas, talvez porque tenha ido com a minha cara. Pode ter sido a soma destes motivos.
         - Eu quero sim, agradeço. Quero pegar as sementes pra plantar.
         - Tenho mamão, quer?
         - Sim, sim, muito obrigado.
         - Vou visitar a minha avó, tenho que visitá-la a cada quinze dias. É minha única parente por aqui.
         - Onde moram seus parentes?
        - Em Goiânia. Lá meu filho mora com minha mãe. Com esta minha luta, falta de tempo, minha mãe percebeu e pediu pra cuidar dele. Olha, ela que não tinha muito mais motivação na vida, ganhou no meu filho a razão da vida dela. E ele dela. Pediu pra mim veja só o menino de quatro anos: “mãe, deixa sempre eu morar com minha avó? ”. Esse menino é uma benção...
         A senhora falou que de seu ordenado, vindo do emprego em uma loja de roupas em Paragominas, repassava a maior parte para o sustento do filho na capital goiana. Tinha muita saudade do filho, aliás como deve ser doído uma mãe ficar longe de seu rebento. Não se pode medir essa lacuna.
         - Tenho que ganhar dinheiro. Não dá tempo nem de estudar. O senhor estudou?
         - Um pouco... me formei em engenharia florestal.
         - Que legal, seu moço. Eu queria fazer faculdade. Nem sei se consigo.
         Comentei sobre o trabalho e sua relação sufocante com o tempo em nossos dias atuais, o que até encurta o ano. Repeti o que ouvi de Pepe Mujica outro dia, “o que te motivas? ”. Lá vai o chato filosofar. Na maioria das vezes, quando me empolgo a falar aforismos, as pessoas fingem se interessar no começo, porém, quando olham pro lado, me dão a pista que desejariam mesmo era que surgisse um conhecido do nada pra salvá-lo daquela viajada conversa maçante.  No entanto, a senhora das sacolas manteve-se atenta. Soltei opinião de que era hora da Humanidade superar a frase famosa de Benjamin Franklin no qual “Tempo é Dinheiro”. Seguimos tal máxima? Chance alta de nos tornarmos escravos. Quando achei que o tema iria terminar, surpreendeu-me o comentário simples, mas certeiro da minha interlocutora:
         - Ahh, é por isso que minha mãe é mais feliz agora com o neto dela. Ela pensa naquilo que a faz feliz e não mais no dinheiro... Dá todo o tempo dela, coisa que não me veio até agora. Já eu, filha, mas tendo que ganhar dinheiro. Tempo meu é pra ganhar dinheiro. Tempo dela é mais pra dar amor. Não admira meu filhinho querer ficar lá.
         Desconcertei. Que análise rica! A senhora desandou a falar dos projetos que tinha. Só lembro de alguns.
         - Meu marido e eu vamos voltar a estudar. Eu quero aprender a falar coreano. Sabia que eu assisto filme coreano pra entender a língua deles? Eu tento ver legenda em português pra aprender... Quer saber, vou começar a caminhar pra emagrecer... Tenho que arrumar uma brecha de tempo, mas tô tão cansada no final do dia... Hidroginástica? Taí, boa ideia, vou me inscrever na hidroginástica.... Dá pra fazer depois do trampo, aí aproveito e relaxo. Tem uma piscina que faz isso lá em Paragominas, sabia? Custa acho que setenta reais por mês, acho que dá pra pagar, dá sim. Vou fazer até janeiro, vou passar férias lá em Goiânia com meu filho, minha mãe e meus irmãos. Não vejo a hora de matar a saudade.
         Desceu em Aurora do Pará.
         Eu segui com a mochila cheia de maracujás, mamões e mais concepções sobre o tempo e a esperança.
   
 
        
 
Pantoja Ramos.
 
 
 

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