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quarta-feira, 9 de agosto de 2023

Carta da Amazônia Gurupaense



Reunidos nos dias 27, 28 e 29 de julho de 2023, no sítio Itapereira, município de Gurupá/PA, no evento denominado I Festa da Floresta, agroextrativistas, agricultores familiares, quilombolas, povos da floresta e suas organizações sociais e religiosas que atuam e representam os territórios locais, Projetos de Assentamento, Reserva de Desenvolvimento Sustentável, Reserva Extrativista e Territórios Quilombolas, expuseram e construíram as diretrizes que devem ser consideradas na busca do bem viver na Amazônia Gurupaense.

Os povos da Floresta Gurupaense, conhecedores dos emergentes debates que cercam a Amazônia, definem três temáticas centrais que devem nortear a efetivação das políticas públicas em nossa região, são elas: a Ecologia Integral, a Emergência Climática e a Sociobioeconomia, assim então, as ações políticas devem ser propostas e implementadas considerando tais temáticas, afirmam sua existência, resistência, e coexistência com a Amazônia, e que devem ser protagonistas na elaboração e execução de todas as ações que visam a manutenção da vida.

Nacionalmente, as políticas públicas passam por um momento de reconstrução, após um período recente de desmonte, no qual a Amazônia e seus povos sofreram constantes ataques. Agora, os esforços para a preservação ambiental voltam-se novamente para a Amazônia, e logo então, as populações que nela vivem serão diretamente afetadas, positiva ou negativamente. Os povos da Floresta Gurupaense, que assim se afirmam, tem compreensão das ações necessárias para a preservação da Amazônia, pois assim o fazem há várias gerações.

Completando seus 400 anos de fundação em 2023, o município de Gurupá possui mais de 80% de seu território com floresta em pé, e apenas 0,74% de área desmatada, assim, seu povo demonstra claramente, por meio de suas ações, que sabe como cuidar da natureza, e por isso deve ser visto como um povo guardião da floresta, bem como, ser respeitado em seus modos de agir, produzir e se organizar, além de ser compensado por tamanho serviço prestado à humanidade. Este mesmo povo, conhecedor do ambiente em que vive, ressalta suas preocupações com a emergência climática que já causa efeitos em nosso município.

O planeta terra é um enorme ecossistema no qual todos estão interligados e as ações promovidas por um, geram impactos em todas as formas de vida, Gurupá já sente estes impactos e eles podem ser percebidos na variação das safras de produtos como o açaí, aumento ou queda incomum no nível das marés, aumento da temperatura e redução nos estoques dos organismos aquáticos coma peixes e camarão, os povos da Floresta Gurupaense, comprometem-se com ações e podem apontar caminhos para a saída deste estado emergencial. Na busca pelo bem viver na Amazônia Gurupaense, há necessidade de compreender os seres humanos como parte integrante do meio ambiente, nada para a Amazônia sem a presença da gente que faz parte deste ecossistema e a garantia de direitos como saúde, educação, saneamento básico, infraestrutura, assistência social, segurança, crédito rural, assistência técnica e extensão rural, segurança alimentar e nutricional, também são a garantia da floresta em pé.

As políticas públicas precisam chegar à Amazônia, de forma que a presença do estado seja melhor percebida, os povos da Floresta Gurupaenses, destacam aqui as seguintes áreas com as quais os governos Federal, Estadual e Municipal, precisam agir de forma urgente, incisiva e coordenada.

  • Regulamentação da Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais;
  • Criação de um Programa de Fortalecimento da Produção Agroextrativista, que garanta Assistência Técnica, Extensão Rural e Crédito aos atendidos;
  • Efetivação da Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural, no município de Gurupá, através do fortalecimento dos órgãos oficiais, com pessoal, equipamentos e transporte;
  • Protagonismo dos agroextrativistas, nas ações de planejamento e gestão das Unidades de Conservação, RDS Itatupâ-Baquiá e RESEX Gurupá-Melgaço;
  • Política educacional que considere e valorize as especificidades da Amazônia Gurupaense, seus povos e sua identidade, com currículo que reconheça a educação agroextrativista, quilombola, de pescadores e agricultores familiares e que esteja integrada aos processos produtivos para assim garantir a permanência dos povos em seus territórios;
  • Instalação de um Polo Universitário em Gurupá, que garanta educação de nível superior pública, gratuita e de qualidade e que atenda a crescente demanda municipal;
  • Titularização de terras no município, e;
  • Fortalecimento do Sistema Único de Saúde no município de Gurupá e sua extensão à todas as comunidades.

Caminhando em consonância com o Governo do Estado do Pará, Gurupá também já se prepara para a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças do Clima, a COP30, que acontecerá em 2025 em Belém do Pará, em preparativo para a COP30, os povos da Floresta Gurupaense, se propõem a apresentar uma carta de relato das experiências de vivência e proteção dos territórios aos representantes políticos do Arquipélago de Marajó.


Ainda planejando, a participação gurupaense na COP30 se propõe construir um plano de participação e consolidação a curto, médio e longo prazo, que resulte no acesso às políticas públicas, também, como forma de fortalecimento das organizações sociais locais, construir um fórum de participação local para a COP30, a realização destas ações, tem como objetivo reforçar o protagonismo local neste evento global.

Neste cenário atual de precificação dos serviços ambientais e dos produtos da biodiversidade, os povos da Floresta Gurupaense afirmam a necessidade de observar-se a presença de gente nos territórios, e a inclusão da área social em todos os debates e decisões, gente com saberes e fazeres que estão em sua identidade e que se relacionam diretamente com seu meio de vida, produção e reprodução.

Debater a sociobioeconomia é urgente para garantir a vida digna dos povos e a integridade das florestas, e o fortalecimento do sistema extrativista de produção através, de formação, crédito, processamento de produtos e acesso ao mercado é uma das formas mais eficientes para o alcance da sustentabilidade em todos os seus múltiplos pilares. As ações governamentais devem visar além da preservação ambiental a garantia dos modos de vida nos territórios.

Através da I Festa da Floresta, que se propõe ser um evento anual, o município de Gurupá, abre o debate urgente à respeito da Amazônia e suas diversas formas de vida, e ansiosos desejamos que tal debate se estenda a outros territórios, a partir de agora, nossas ações de reivindicação devem basear-se nas diretrizes coletivamente aqui estabelecidas.


Sítio Itapereira, Gurupá/PA, 29 de julho de 2023.






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