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segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

Sofá de napa: o fenômeno


Era uma vez um sofá. 

Era um sofá destes de napa que eu nem sei se ainda são fabricados, onde eu sempre me jogava pra assistir televisão, às vezes a TVS (hoje SBT), às vezes a Globo. 

Talvez fosse 1985 ou 1986, não recordo. Só sei que certa vez eu ganhei o raro momento de ficar sozinho em casa à noite. Num lar em que vivam meu pai, minha mãe e meus quatro irmãos, não era algo fácil de acontecer. Ahh, vejam só: iria atacar a latinha de chocolate em pó como bom gatuno de dispensa que fui.

E nesta dita noite fiquei a assistir TV sozinho, ali por volta das 21 horas. O filme? Poltergeist, O Fenômeno, de Steven Spielberg.

E assim que a película iniciou, logo percebi que não era tão boa ideia ficar em casa, solitário, de noite, vendo o desenrolar de uma trama onde espíritos tramavam contra moradores de uma casa, numa bagunça ectoplasma hostil. Muita visagem e muita misura perturbando de tudo quanto era canto aquela família, morada feita onde antes havia um antigo cemitério. Aliás, que raios eram essas construções feitas em cima de lugares sinistros! Era melhor perguntar antes de comprar: "com licença, senhor vendedor, mas esta casa está assentada onde?". Ao que o outro responderia: "nada não, no máximo um assassinato".

E desenrolou-se a história. "Tô sozinho e sou corajoso", pensei.

E no ápice do filme, com os mortos brincando de pira pra cima e pra baixo, eis que venho com minha colher cheia de achocolatado extraviada quando o tudo-de-ruim mete a cara pra fora do guarda-roupa e espanta a todos. Eu, vidrado, me sento no exato instante que o monstro urra!

Sento-me no sofá de napa que faz:

- Fuuuuuuuuuuuuuu...

...

Quando dei por mim, estava no final da primeira quadra da rua 92, e pelo jeito, corri com a colher na mão.  

Quando meus pais e irmãos chegaram, eu estava no banco de fora da casa tossindo. 

- Tudo bem Carlinho?

- Tá sim. Cof! Cof!

- Mas também? pegando friagem. Entra menino!


E assim fui dormir desconfiado do meu guarda-roupa, com as narinas cheias de pó de chocolate.




Pantoja Ramos.


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