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domingo, 20 de dezembro de 2020

SUBSERVIÊNCIA, A QUE OU A QUEM SERVE? Por Manoel Tourinho

 

Decreta-se que nada será obrigado nem proibido. Tudo será permitido, sobretudo brincar com os rinocerontes e caminhar pelas tardes com uma imensa begônia na lapela (Tiago de Melo em Estatutos do Homem).

 

 

O gesto do Reitor em atentar contra a consulta popular para a formação da lista tríplice, substituindo-a por eleições indiretas, ao melhor estilo do período do Brasil obscurantista, é sintoma do desconhecimento da história de luta libertária travada no Brasil em defesa do ensino público; da mesma forma que desconhece que, na ditadura militar, o paraense secundarista Edson Luís foi assassinado pelos militares na esplanada do Calabouço no Rio de Janeiro, exatamente porque estava participando de movimentos estudantis em defesa da democracia e da liberdade. O Calabouço ou ‘Calaba’ era um dos espaços de resistência contra a ditadura. A UNE era outro espaço, logo invadida, destruída e fechada. Isto, em 1968. O Ato-Institucional n0 5 foi um golpe mortal na democracia e na liberdade da Nação. Nos anos antecedentes ao golpe de 1964, uma das bandeiras do movimento estudantil superior sob o comando da UNE, era a participação dos estudantes nos colegiados das IFES. Inicialmente conseguiu-se uma voz, a do Presidente do Diretório Central dos Estudantes das IFES. Era o início da luta, que reverberou no movimento para conseguir 1/3 dos votos nos colegiados gestores, principalmente nas denominadas Congregações. A então Escola de Agronomia da Amazônia (EAA), esteve fortemente engajada nessa luta, mas, também, contra os movimentos de encampação acionados pela Universidade Federal do Pará. Foram muitas as vezes que estivemos à frente do prédio da Reitoria da UFPA, na antiga São Jerônimo, hoje Gov. José Malcher, gritando contra o autoritarismo da proposta. Vencemos! Mas sem luta não venceríamos. “A luta é a ultima razão do Ser”, nos ensinam os escritos do velho Mouro. Escola de Agronomia, FCAP e UFRA, representam trajetórias de luta democrática, nunca de subserviência irrefutável diante do mando autoritário. Lutas que trouxeram à liça, lideranças de jovens alunas de um ensino então dominado por um machismo exacerbado. Algumas dessas lideranças ainda caminham no nosso campus, a exemplo da Profa. Adélia Benedita Coelho de Souza. Nunca houve recuo; ao contrário, sempre se avançou. O mais notável desses avanços foi a criação da UFRA, na via da trajetória histórica, assegurando a indivisibilidade e perpetuação da luta, assegurando a participação democrática e popular através de instrumentos como a Estatuinte Universitária, o Conselho Consultivo Externo e o Planejamento Estratégico. Mas todos esses instrumentos não teriam sido concebidos se a obediência cega aos ditames do poder central em Brasília tivesse ocorrido, porque o nascimento da UFRA aconteceu, ainda que na contramão dos sentimentos privatistas dominantes na agenda do então Ministro da Educação.

 

Senhor Reitor, inscreva o seu nome entre aqueles que enfrentam o poder, irrefutavelmente, por uma boa causa. Retire sua mensagem imoral enviada ao Consun; lute pela liberdade e pelas causas democráticas. Esteja certo de que as dores que essa atitude poderá trazer-lhe serão bem menores do que obscurecer-se, sujando-se como um homem sem coragem, acovardado, subserviente e bajulador do poder.

 

Manoel Tourinho,

Ex-Reitor e Professor Emérito da UFRA.

 

 

 

  

 

 

 

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