Decreta-se
que nada será obrigado nem proibido. Tudo será permitido, sobretudo brincar com
os rinocerontes e caminhar pelas tardes com uma imensa begônia na lapela (Tiago de Melo em Estatutos do
Homem).
O gesto
do Reitor em atentar contra a consulta popular para a formação da lista
tríplice, substituindo-a por eleições indiretas, ao melhor estilo do período do
Brasil obscurantista, é sintoma do desconhecimento da história de luta libertária
travada no Brasil em defesa do ensino público; da mesma forma que desconhece que,
na ditadura militar, o paraense secundarista Edson Luís foi assassinado pelos
militares na esplanada do Calabouço no Rio de Janeiro, exatamente porque estava
participando de movimentos estudantis em defesa da democracia e da liberdade. O
Calabouço ou ‘Calaba’ era um dos espaços de resistência contra a ditadura. A
UNE era outro espaço, logo invadida, destruída e fechada. Isto, em 1968. O Ato-Institucional
n0 5 foi um golpe mortal na democracia e na liberdade da Nação. Nos
anos antecedentes ao golpe de 1964, uma das bandeiras do movimento estudantil
superior sob o comando da UNE, era a participação dos estudantes nos colegiados
das IFES. Inicialmente conseguiu-se uma voz, a do Presidente do Diretório
Central dos Estudantes das IFES. Era o início da luta, que reverberou no
movimento para conseguir 1/3 dos votos nos colegiados gestores, principalmente
nas denominadas Congregações. A então Escola de Agronomia da Amazônia (EAA),
esteve fortemente engajada nessa luta, mas, também, contra os movimentos de
encampação acionados pela Universidade Federal do Pará. Foram muitas as vezes que
estivemos à frente do prédio da Reitoria da UFPA, na antiga São Jerônimo, hoje
Gov. José Malcher, gritando contra o autoritarismo da proposta. Vencemos! Mas
sem luta não venceríamos. “A luta é a ultima razão do Ser”, nos ensinam os
escritos do velho Mouro. Escola de Agronomia, FCAP e UFRA, representam trajetórias
de luta democrática, nunca de subserviência irrefutável diante do mando
autoritário. Lutas que trouxeram à liça, lideranças de jovens alunas de um
ensino então dominado por um machismo exacerbado. Algumas dessas lideranças
ainda caminham no nosso campus, a exemplo da Profa. Adélia Benedita Coelho de
Souza. Nunca houve recuo; ao contrário, sempre se avançou. O mais notável
desses avanços foi a criação da UFRA, na via da trajetória histórica,
assegurando a indivisibilidade e perpetuação da luta, assegurando a
participação democrática e popular através de instrumentos como a Estatuinte
Universitária, o Conselho Consultivo Externo e o Planejamento Estratégico. Mas
todos esses instrumentos não teriam sido concebidos se a obediência cega aos ditames
do poder central em Brasília tivesse ocorrido, porque o nascimento da UFRA aconteceu,
ainda que na contramão dos sentimentos privatistas dominantes na agenda do
então Ministro da Educação.
Senhor
Reitor, inscreva o seu nome entre aqueles que enfrentam o poder,
irrefutavelmente, por uma boa causa. Retire sua mensagem imoral enviada ao
Consun; lute pela liberdade e pelas causas democráticas. Esteja certo de que as
dores que essa atitude poderá trazer-lhe serão bem menores do que obscurecer-se,
sujando-se como um homem sem coragem, acovardado, subserviente e bajulador do
poder.
Manoel Tourinho,
Ex-Reitor e Professor
Emérito da UFRA.
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