quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

O lago Acuti-pereira

        
                    Saberes da Terra, Portel, 13 de dezembro de 2013.

A garça com seu bico bateu no galho
Alvorada fim de maio
Inverno não tão forte
Orquestra lago norte
E a passarada chegou de lá de cá

As passarinhas cores se aplumaram
Esticaram bicos e testaram
O passo que alonga
As asas quantas conta
Aquecidas no sol para bailar

E o quiquió enxerido
FIU-FIU para a rolinha!
E o quiquió vidrado
FIU-FIU para a andorinha!
E o quiquió ousado
FIU-FIU pra ciganinha!
E o quiquió tão encantado!

E o galante orgulhoso
BEM-TE-VI siririzinha!
E o sedutor insiste
BEM-TE-VI pra coroquinha!
E o cortejo ensaia
BEM-TE-VI maria-bestinha!
Do voador que é bem amado.

Piriquitinhas no movimento
Faziam círculos no vento
Tão rente aquele ramo
Tão parte de seus planos
Cai cai frutinha de açaí

Japiins
Rodando
Voando
Pousando

Garça
Regendo
Sabendo
Enredo

Mutum desliza, Pitilique pula, Juruti rodopia, Jacu pirueta,
Tucana imita
Tal qual uma seta



Ariramba
Tão bamba
Meio valsa
Meio samba

Pipira
Ó Lira
Que gira
Envira

Nambu saltita, Pavãozinho roda, Cujubim desfila, Socó perneia
Gavião que dança
No ar se lança


Maracanã encolhida fica no meio
Rodeada de marrecas que em cheio
Jogavam as palhinhas
Baixavam quietinhas
Para o aplauso da plateia alada

Os papagaios gritando descem a cortina
Pro fim da dança das meninas
Azul escurecendo
O palco acabou sendo
O lago Acuti-pereira
Pantoja Ramos

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Extrativista, Quanto Vale a Floresta?

Caiu mais uma árvore de angelim vermelho. E o preço dela pago na hora pelo madeireiro foi de 50 reais a árvore. Para o velho piquiá, pagou-se não mais que 30 reais. E se pergunta ao extrativista, ao amazônida, ao brasileiro: quanto vale a floresta?



Se pararmos pra pensar um pouco, tal qual na parábola dos talentos, a sociedade brasileira tem algo valioso que não sabe cuidar. Talvez a maior pobreza da nação seja não reconhecer a riqueza que temos, esvaindo-se ela em balsas de toras que somem pelo rio, levando tudo, não deixando nada.


E como pode um angelim de 10 metros cúbicos de volume ser vendido a 50 reais?! Oficialmente, pelas normas do Pará, seu valor é no mínimo de R$51,12 o metro cúbico da árvore em pé. Ou seja, ao menos R$511,20 vale este indivíduo, patrimônio da floresta pública. Se explorado e transportado, vá lá, perdendo 30% de seu volume e passando a 7 metros cúbicos aproveitáveis, com valor em tora de R$170,00 o metro cúbico, o valor da árvore exemplo passa a ser de R$1.190,00. 
Contra os  50 reais arrematados pelo madeireiro.


Ao considerar que 40% se perde no beneficiamento (passando de 7 metros cúbicos em tora para cerca de 4 m3 de madeira processada), a um valor de R$ 600 pago pelo mercado pelo metro cúbico serrado, a mesma árvore de angelim chega ao consumidor a um preço de R$2.400,00.


Contra os 50 reais comprados na informalidade e na falta de informação.

Agora, multipliquem esta situação às inúmeras retiradas de madeiras clandestinas em nossa Amazônia. São milhões e milhões de reais furtados dos cidadãos amazônicos por ganância de uns em detrimento de milhares de famílias agroextrativistas. Imagine-se o quanto se perde no avanço do desmatamento. Não se trata apenas de crime ambiental: é crime socioambiental por tirar economia da geração vindoura.


Entretanto, há esperança como sempre no amanhecer do dia. Gente que reconhece, por exemplo, que é melhor investir em frutos de açaí do que decepar palmito sem planejar o futuro. Que faz a conta das mais simples: se um açaizal tem 600 touceiras em 1 hectare, com 2 estipes produtivos no mínimo a produzir cada um meia lata de frutos, recebe ao final a vitória de ter 600 latas por hectare. Disseram-me que no rio Canaticu, Curralinho, em 2011, a média de preços da lata foi de R$10,00. Ora, nada mal termos 6 mil reais por hectare com a valorização de frutos do açaí!


E se cuidássemos da copaíba? Pois seu Pacatuba, lá do Moju, me diz que encontra do tipo vermelha que produz fácil 15 litros de óleo. Se o litro é vendido a 60 reais nos mercados, é mais viável derrubar copaíba pela madeira ou aproveitar o seu medicinal óleo? Neste exemplo, são R$900,00 de três em três anos que se pode ter.


E se contássemos o que tem na mata? Tenho certeza de que teríamos outra postura diante de toda destruição existente. Em 100 hectares inventariados em Portel, estudos do Instituto Floresta Tropical encontram potencial de receita vinda de manejo florestal comunitário em 250 mil reais por ano para madeira em pé, 750 mil reais por ano para madeira em tora e 1,2 milhões de reais por ano em madeira serrada, considerando uma extração de apenas 10 metros cúbicos de madeira por hectare.

Com toda esta possibilidade, não deveriam existir famílias com apenas uma só parede a proteger do frio amazônico. As inúmeras reservas extrativistas, assentamentos agroextrativistas e territórios quilombolas poderiam (aplicando manejo florestal) suprir a necessidade de casas. Então porque não pensar em um Programa de Aquisição de Madeira Manejada para os planos governamentais de habitação rural? Áreas de manejo não faltariam, com certeza. E uma nova forma de renda surgiria.

Mas todas as comparações acima mencionam preço. No entanto, qual o valor da floresta? Quanto vale o clima saudável de uma mata, a escorrer os rios passando pela nossa lembrança de infância? Tem preço a receita da avó nossa servindo piquiá cozido? Quão monetário deve merecer a árvore que convida os bichos ao banquete de suas sementes e frutos? 


Diante do aumento do desmatamento e da escalada da extração ilegal de madeira, é moralmente necessário cuidar da floresta e pensá-la como algo sem preço e sim com apreço e valor.  

É pra ontem essa urgência, pois o hoje nos preocupa o amanhã.  


                                                                                                                                                                                                               Pantoja Ramos, 27 de novembro de 2013