segunda-feira, 25 de junho de 2012

Carta sobre planos de uso dos recursos naturais



Alto Rio Camarapi, Portel, 06 de junho de 2012.

Caríssimos
Pedro, Bira, Girolamo, Juci, Codó e Alípio.

Esta viagem que faço para Portel, no Marajó, trata do lançamento do projeto do Sindicato de Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais de Portel (STTR Portel) em parceria com o Instituto de Desenvolvimento Florestal do Estado do Pará (IDEFLOR). Seu propósito é incentivar a elaboração de planos de uso dos recursos naturais de cerca de 60 famílias comunidades que fazem parte da estratégia do IDEFLOR de estabelecer Decreto de Reserva de 274.919 hectares envolvendo cerca das micro-regiões Jacaré-Puru, Alto Camarapi, Acangatá e Acuti-pereira. Ao lembrar a 15 anos atrás dos debates sobre planos de uso documentados em Gurupá, que o plano de uso acordado pela comunidade antes da destinação fundiário, é um bom preparo das famílias para recebimento do documento fundiário, uma contrapartida de fato para as concessões de direito real de uso.

As localidades Ilha de Santa Bárbara, Ilha das Cinzas e rio Jaburu são alguns dos exemplos que mais me recordo em seus detalhes, talvez por conta de ter acompanhado de perto e com maior intensidade, todas hoje regularizadas em formato de assentamentos agroextrativista ou Reserva de Desenvolvimento Sustentável. Aprendi nestas construções participativas que discutir regras de uso da mata e dos rios estava além de discutir segurança da terra, tratando-se de uma luta pela manutenção das famílias.

Nestes lugares pude perceber que as regras comunitárias seriam o direcionador de todas as ações em agricultura e extrativismo realizadas pelas comunidades, com os limites de respeito entre cada posse como redutor de conflitos. Assim uma posse historicamente iria do igarapé limão até o tracuá e tudo estava acertado entre os confinantes. Deste modo não seria permitido bater timbó. Assim ficava estabelecido que explorar madeira seria apenas se houvesse manejo florestal. Aliás, neste ponto, percebi ao visitar alguns assentamentos, que a falta de discussão prévia sobre onde e como seriam feitas determinadas atividades agroflorestais, abriu-se a porta para espertalhões que se aproveitaram da terra regularizada para praticar a extração predatória.

Entendi que quando se debate a natureza e a convivência entre famílias, todos ficam mais fortes. Daí a conseqüência de estarmos mencionando a regularização fundiária como conseqüência nos casos Santa Bárbara, Ilha das Cinzas, Jaburu. Acho até que a avaliação de tais planos é estratégia de reacender a chama da organização comunitária, agora em vez da luta pela terra, da batalha pela valorização da floresta. Se bem ganhamos, bem temos que manter.
Acho muito louvável que o IDEFLOR inicie a regularização fundiária a partir de diagnóstico socioeconômico e plano de uso dos recursos naturais nas comunidades portelenses. Em um tempo em que a direção do ITERPA assume o posicionamento retrógrado de não mais desejar destinar terras por meio coletivo, no mesmo governo tem-se uma opinião contrária, onde a discussão precisa passar sob o ponto de vista territorial de utilização dos recursos florestais e aquáticos por famílias agroextrativistas. Interessante este certo impasse, o que significa que o processo de ordenamento passa a ser mais importante que o entendimento de um ou dois indivíduos do que é regularizar terras.
Portanto, lá vou eu novamente ajudar na elaboração de planos de uso, convidado que fui pelo STTR de Portel e IDEFLOR.

Além de elaborar, a ocasião é ótima para avaliar o caso do rio Acuti-pereira. Da grave crise humanitária que se instalou naquela localidade em abril de 2004, quando da morte de 17 pessoas por hidrofobia causada por morcegos, naquele mesmo ano as comunidades analisaram a maneira como tratavam a fauna e flora, em época em que balsas de madeira escapavam do rio, empobrecendo ainda mais os moradores. Com isso, as associações Associação dos Trabalhadores Agroextrativistas do Acuti-pereira (ATAAP) e Associação dos Produtores Extrativistas do Rio Acuti-pereira (APERAP) construíram leis comunitárias para disciplinar a caça e a pesca, ao mesmo tempo em que se manifestaram contra a extração madeireira, ameaçando fechar o rio. Se não conseguiram sua tão sonhada Reserva Extrativista (perdido o processo dentro da intrincada transição entre IBAMA e ICMBIO), ao menos melhoraram suas ofertas de caça, pescado e produção de açaí, segundo os relatos que tomei neste janeiro de 2012 quando visitei a comunidade Laranjal, terra da querida Vanica. Não sabem os moradores afirmar em termos numéricos este avanço, mas sentem a diferença nestes oito anos. É momento realmente de avaliar para aprender e ensinar.

O Plano de Uso é um constante estado de alerta. Depois do que vi em uma comunidade que tinha suas leis, mas as fizeram cair pela sedução madeireira, penso ser necessário que as associações agroextrativistas passem a dar o mesmo peso em relevância das assembléias de eleição de diretoria com as assembléias de avaliação dos planos de uso dos recursos naturais.

Seria uma prova de lealdade com o futuro. Um pacto com os ainda não nascidos.

Aos mestres, escrevi.

Carlos Augusto Pantoja Ramos

Pantoja Ramos
Enviado por Pantoja Ramos em 18/06/2012
Reeditado em 19/06/2012
Código do texto: T3729942

domingo, 17 de junho de 2012

Após expulsarem latifundiários, moradores da floresta dão exemplo de sustentabilidade



Gurupá é uma das regiões no Brasil onde o direito de uso e de acesso à terra e aos recursos naturais pelas comunidades locais foi mais bem resolvido. A floresta é explorada, mas 96% da mata seguem intactos.

O índice de prosperidade tem indicadores próprios na Ilha das Cinzas. E ele é considerado alto pelos moradores: as 60 famílias têm um barco cada uma, as casas foram recentemente equipadas com televisão e parabólicas, não falta diesel para abastecer o gerador de energia elétrica, todos usam coletivamente computadores conectados na internet via satélite.

A comunidade é cravada na floresta, rodeada pela águas do rio Amazonas, no oeste do estado do Pará, e fica a quatro horas de barco da cidade mais próxima.
A melhoria de vida no local é recente. A situação começou a mudar quando os moradores se uniram para acabar com o domínio dos latifundiários, no início de 2000, e passaram de posseiros informais a donos legais da terra onde sempre viveram. A tranquilidade trazida pelo direito de posse ajudou a acabar com a miséria.

"Antes, todos aqui eram muito pobres. Mas agora todo mundo conseguiu muita coisa. Nós nos unimos e colocamos o conhecimento em prática", conta Manuel Malheiros de Oliveira, presidente da Associação dos Trabalhadores Agroextrativistas da Ilha das Cinzas.

O município de Gurupá, do qual a ilha faz parte, é uma das regiões no Brasil onde o direito de uso, de acesso à terra e aos recursos naturais pelas comunidades locais foi mais bem equacionado. Por iniciativa dos moradores, 99% do território do município estão atualmente em processo de regularização. O controle das florestas pela população local também é modelo de preservação – 96% da mata do município continuam intactos.


A expulsão do latifundiário ilegal
A figura do "patrão" fez parte da história da região até há pouco. Ele se dizia dono de grandes faixas de terra, exigia que fosse o único comprador da produção dos posseiros que ocupavam sua propriedade. O patrão cobrava ainda desses moradores 5% de "taxa de uso do solo". Esse modelo se perpetuou por décadas, até que um levantamento fundiário feito com apoio do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais mostrou que a maioria das escrituras desses latifundiários não tinha validade.

"A extensão de terra declarada em escrituras era quase duas vezes maior do que o tamanho do município. Havia muito documento falso", conta Manuel Pantoja da Costa, o Bira, presidente do Instituto Gurupá, que apoia e capacita a comunidade local. Como a região está localizada numa área de marinha (região de interesse da União) a posse do território tem que ser autorizada pelo governo federal. E muitos latifundiários que exploravam a floresta o faziam na ilegalidade, com documentos forjados.

Conscientes da situação, as comunidades tradicionais iniciaram a briga para assumir o controle. Aos poucos, o governo foi concedendo a posse aos donos de direito, a associações, como a da Ilha das Cinzas, criando reservas sustentáveis, agroextrativistas e quilombolas.

"Fizemos um trabalho de capacitação ao longo de dez anos junto aos moradores. Nós trouxemos informação sobre leis, sobre os direitos que tinham e eles brigaram pelo resto", lembra Jorge Pinto, engenheiro agrônomo que na época atuava na ong Fase.

Como consequência do processo de transferência da posse às comunidades locais, uma das madeireiras mais tradicionais da região, a Brumasa, se viu obrigada a fechar as portas. A empresa, que até então controlava os posseiros, foi asfixiada pelos custos de uma cadeia de produção legal.


Antes de o governo aparecer
As 60 famílias da Ilha das Cinzas receberam do governo a concessão de direito real de uso como Projeto de Assentamento Agroextrativista só em 2006, quatro anos após encaminharem o pedido. O acordo comunitário para a exploração sustentável da floresta, por outro lado, já havia sido traçado em 1997.
Foi quando os moradores criaram o Plano de Uso, um pacto coletivo que diz o que e onde pode ser feito. A pesca do camarão foi a primeira a passar por adequações: cada família, que antes usava até 200 armadilhas (matapi), passou a usar 75 no máximo. "Foi o nosso acordo de pesca. Depois disso, o preço do camarão melhorou e as horas de trabalho diminuíram", diz Francisco Barbosa Malheiros, membro da associação.

Com o tempo extra, os ribeirinhos passaram a explorar outras atividades, como o manejo do açaí, hoje a principal fonte de renda da comunidade. De lá para cá, o ganho das famílias dobrou – passou de 1 para 2,5 salários mínimos.

"Toda a parte de desenvolvimento socioeconômico e melhoria da qualidade de vida tem sido feita junto com o manejo da floresta. Eles optaram pela sustentabilidade e pela preservação. E fizeram isso antes da presença do governo", lembra Luís Carlos Joels, consultor e ex-diretor do Serviço Florestal Brasileiro.

Também as casas rodeadas pela floresta amazônica têm televisão, máquina de lavar e celular. Mas a energia elétrica ainda é artigo de luxo. Como não são conectados à rede distribuidora pública, os moradores gastam 300 reais por mês por três horas de eletricidade por dia, das sete às dez da noite. A despesa alta se deve ao preço do diesel que abastece o gerador.
Ainda assim, ninguém ali troca a Ilha das Cinzas pelo ambiente urbano. "Na cidade, você precisa de dinheiro para sobreviver. Aqui é diferente: trabalhando e fazendo o manejo da floresta você tem sempre o que comer, sem precisar gastar. Só é preciso saber trabalhar com a natureza, sem destruir", justifica seu apego ao lugar Manuel Malheiros de Oliveira.

Autora: Nádia Pontes
Revisão: Roselaine Wandscheer

quinta-feira, 14 de junho de 2012

terça-feira, 12 de junho de 2012

A rede Rosada e a rede Xadrex


Gurupá, 2005.


A rede rosada
sublime
exalava
perfume
pra certa
rede Xadrex

que veio em balanço
bem calmo
e manso
cantando
cortejos
e assim o fez

“esta viagem é um sonho
pois você eu queria encontrar
te espana e encosta em meu punho
para que eu nunca mais possa acordar.”

a rede rosada
se viu
vermelhada
e deixou
o Xadrex
bem perto de si

e bem se tocando
foram
balançando
com aquele
Banzeiro
aplaudindo assim

“mas que ilusão venerada
que eu nunca mas tinha avistado
que pena! a dona da Rosada
vai descer no primeiro aportado.”


a rede Xadrex
engatou
por sua vez
sua corda
pra amada
não ter que ir

a moça puxava
enfim
desatava
guardava
a rosada
e assim partir

“volta, ó minha adorada
então juro, eu vou te buscar
que seja minha derrocada
nós juntos vamos balançar!”

a rede Rosada
de dentro
chorava
da mala
se ouvia
um suspiro fino

e aí se separam
mas sempre
lembravam
dos bons
ventos-canto
o som do hino

“esta viagem é pra sempre
que eu nunca mais possa aportar
nos anos, que a gente se lembre
dos tempos de um lindo tocar”

a rede Xadrez
faz três anos
talvez
que procura
a Rosada
nos barcos afora

já toda puída
mas bem
destemida
enfrenta
as ondas
bradando agora

“ó maresia do mundo,
me ajuda e que eu possa encontrar
me veja como estou moribundo
sem rumo, sem força, sem lar.”

engata na franja
a Rosa
com mancha
a rede
perfume
a exalar

o Xadrez se espanta
feliz
é que espana
que acorda
os outros
com seu gritar

“Esta viagem é de sorte!
Pois você, meu amor, encontrei!
e nem que eu rasgue pra morte!
minha vida valeu, eu bem sei...”

A dona da Rosada
e o moço do Xadrex
também ficaram engatados
para o fim da vida
o vento que os balança
é o mesmo que nos sopra
e lá na alma agitam
o Xadrex e a Rosada
não é Banzeiro?
“que os digam!!”
Pantoja Ramos
Enviado por Pantoja Ramos em 19/04/2011
Reeditado em 26/04/2011
Código do texto: T2918178

segunda-feira, 11 de junho de 2012



Documentário que mostra belezas e contrastes do maior arquipélago fluviomarinho do mundo, o ‘Expedição Viva Marajó’, de Regina Jeha, será lançado no próximo dia 12 de junho, durante a Rio+20, no Espaço Unibanco Arteplex, no Rio de Janeiro. Dia 14, a pré-estreia  será em São Paulo, no Cine Livraria Cultura, onde ficará em cartaz com sessão diária, às 18h.

O filme de 52 minutos foi produzido pela Lauper Films, com apoio do Fundo Vale e o do Instituto Peabiru, que desenvolve o Programa Viva Marajó. O documentário já foi exibido em Belém e em 15 municípios marajoaras. 

O longa participou de vários festivais internacionais, entre eles 24° FIPA Situation de La Création Internationale (França); 4° Upto3 (Canadá); 9° Ischia Film Festival-Offical Selection (Itália). 
Fonte: Instituto Peabiru

sexta-feira, 1 de junho de 2012

What Rights?


O relatório abaixo apresenta uma análise da legislação que diz respeito aos direitos de posse de Povos Indígenas e Comunidades das Florestas em uma escala global, avaliando os sistemas jurídicos dos 27 dos países mais arborizadas do mundo em desenvolvimento para reconhecimento dos direitos dos Povos Indígenas e comunidades sobre acesso, gerenciamento e alienação de terras e recursos florestais.

Os países incluídos neste estudo são o lar de 2,2 bilhões de pessoas rurais e incluem cerca de 75% das florestas no mundo em desenvolvimento.

http://www.rightsandresources.org/documents/files/doc_4924.pdf