sexta-feira, 12 de janeiro de 2024

Crônicas, passageiro: o mourão

 


Marajó, 12 de janeiro de 2024.


- Chegou a madeira?

- Chegou, patrão. Já pedi pra tirarem pra terra.

- Quanto tu pagaste por tarugo?

- Paguei 10 reais pro pessoal de lá.

- Me diz uma coisa: quantos tarugos tu tiras por árvore de acapu?

- Hummm... patrão, depende. Depende da árvore, se for acapu de boa grossura, de 40 a 50 tarugos. Mas tá meio difícil achar desse tipo lá onde eu pego quando o senhor me encomenda.

- Ahh, vejo que anda contigo tua mulher e filha.

- É, a gente se juntou faz pouco tempo. Mas elas estão viajando comigo só pra evitar confusão.

- Confusão?

- É que antes era casada com um sujeito... Mas pensa num cara que não tinha nada... nem o de comer!  Ele foi trabalhando pra mim aos poucos. Eu levava arroz, feijão, charque, mortadela, frango (às vezes) e ele me pagava com tarugo de acapu. A cada dia que eu ia ficando mais chegado na família dele, eles dependendo de mim, fui ficando mais chegado, mais chegado... o senhor entende, né?

- Acho que entendi.

- Num falou nada quando a mulher veio embora comigo.

- Ele ficou lá?

- Não só ficou como trabalha comigo na tiração de tarugo dos vizinhos. Pelo menos do que ainda tem de acapu por lá. Mas já vi que vai acabar logo, logo.

- E daqui tu vais pra onde?

- Ahh, patrão, acho que vou quietar um pouco dessas viagens, vender um dos três barcos que tenho e comprar um terreno lá pra Cametá. Diz que a soja já tá em Baião e eu quero estar no meu terreno quando lá chegar.

- Assim tu vais longe...