Em 2009 terminou um longo e desgastante processo de desocupação de terras indígenas em Roraima, de onde plantadores de arroz foram retirados da reserva Raposa Terra do Sol. Aos poucos o assunto perdeu o interesse dos meios de comunicação e foi esfriando, até que uma nova luz vermelha se acendeu, desta vez no arquipélago do Marajó, onde já se instalou a maior parte dos produtores de arroz expulsos de Roraima, com uma proposta de ocupar 300 mil hectares com essa cultura.
Marajó é um dos
territórios mais pobres do Brasil e, apesar de ser desde 1989, ano da
Constituição do Estado do Pará, uma Área de Proteção Ambiental, nenhuma ação
efetiva para a gestão dessa APA e para a regularização fundiária da região
jamais foi implementada. Desde 2010 organizações da sociedade civil vem
trabalhando para a estruturação de um plano para elevar a região à categoria de
“Reserva da Biosfera” a ser reconhecida pela UNESCO. O processo está em
andamento e é coordenado pela ONG Instituto Peabiru em um programa chamado
“Viva Marajó”.
O pesquisador João
Meirelles, diretor do Peabiru e autor de diversos livros sobre a Amazônia,
alerta que a ocupação desordenada dessa região vai afetar a vida de milhares de
quilombolas, ribeirinhos e moradores do Marajó, e aponta a inexistência de
Estudos de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA) para
expansão da monocultura de arroz no Marajó. Ele explica que o Marajó é a
única área do Pará que não possui o Zoneamento Ecológico Econômico e a
elaboração de um Plano de Manejo da APA seria o primeiro passo para se discutir
a implantação de grandes projetos econômicos na região.
O tema está sendo alvo
de debates no âmbito da Federação da Pecuária e da Agricultura do Pará, do
Conselho do Agronegócio do Pará e da Secretaria de Estado da Agricultura, que
na última desta terça-feira, 29 de janeiro, reuniram-se em Belém para debater o
potencial econômico da produção de arroz irrigado no Marajó. Mas ficou fora da
pauta as questões ambientais, fundiárias, sociais e de arqueologia que envolvem
a atividade.
Está se formando em
torno desse tema o duro jogo maniqueísta de “quem é contra joga a favor da fome
e da pobreza” e que preservar a biodiversidade e a cultura local significa
“condenar a população à miséria”. Não se discute um aspectos relativamente
simples, que é cumprir a legislação ambiental e fundiária em uma região onde
apenas 25% dos pouco mais de dez milhões de hectares é legalizada com títulos
de propriedade e destinações públicas.
O que grupos
ambientalistas e lideranças sociais da própria
região defendem é que se faça a regularização fundiária da região, junto com um
Zoneamento Ecológico Econômico para que se definam as áreas passiveis para a
exploração agrícola e pecuária, não apenas pelos produtores de arroz, mas para
qualquer atividade de impacto na região.
Algumas das principais
questões sociais e culturais levantadas ambientalistas e lideranças sociais
são:
- Saúde humana – o uso
de agrotóxicos em larga escala, especialmente aqueles lançados por aviões,
constitui-se em forte ameaça à saúde de crianças e idosos;
- Agravamento de risco
de doenças – a presença de grandes áreas inundadas, inclusive em períodos de
seca, no entorno de núcleos urbanos poderá resultar em aumento de insetos
transmissores de doenças tropicais (dengue e malária, principalmente), o que
precisa ser monitorado;
- Exclusão da
participação local – A comunidade local está totalmente excluída. Os moradores
das comunidades do entorno das fazendas de arrozeiros são afetados diretamente
pelos empreendimentos e ninguém os ouviu!
- Comunidades
Quilombolas – qualquer empreendimento de grande porte precisa ouvir as
comunidades quilombolas do entorno;
- Patrimônio
arqueológico – por lei, qualquer intervenção de grande porte precisa ser
precedida de estudo sobre a existência de patrimônio arqueológico. A região do
Marajó é considerada como uma das que possui maior patrimônio de artefatos de
cerâmica do Brasil.
É simples, cumpra-se a
lei e haverá espaço para todos.
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