segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

A luta da Comunidade Repartimento pelo uso de seus recursos naturais - PARTE 4



Desde o dia 26 de dezembro de 2014, as famílias da comunidade Repartimento dos Pilões, Almeirim-Pa,  reuniram-se em protesto às operações florestais da Empresa Jari. Alegam que as operações de extração de madeira adentraram na área de uso dos comunitários.

Policiais foram ao local tentar retirar as pessoas, que mantem-se na posição até que o poder judiciário se manifeste sobre a regularização fundiária das famílias locais e limites do Plano de Manejo Florestal Empresarial.

Foram enviados a este blog fotos do protesto na área florestal de Repartimento, segundo relatos, feito de forma pacífica, porém, firme em suas opiniões.












sábado, 27 de dezembro de 2014

A luta da Comunidade Repartimento pelo uso de seus recursos naturais - PARTE 3

Em Dezembro de 2010, a Rede Intercomunitária Almeirim em Ação (RICA) enviou à Secretaria Estadual de Meio Ambiente ofício demonstrando sua preocupação sobre as atividades florestais da Empesa Jari em áreas próximas de comunidades.

No documento, a RICA expressa a intenção de debater o assunto no município, convidando entidades como SEMA, Ministério Público Estadual , ICMBIO, Defensoria Agrária e FSC a comparecerem em 03 de março de 2015 para discutir os impactos das operações da referida empresa na vida das comunidades adjacentes à FLOTA Paru e Estação Ecológica do Jari.

Abaixo, segue o convite da RICA para esta discussão.


quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

A luta da Comunidade Repartimento pelo uso de seus recursos naturais - PARTE 2



Denúncia de setembro de 2014 feita por moradores da comunidade Repartimento dos Pilões, Almeirim-Pa sobre o desmatamento causado por pessoas ligadas a grupos empresariais da região.

Desde então, foram tomadas providências?



Para mais detalhes ver os links:

  • https://www.youtube.com/watch?v=3CAmiQvyb4U
  • https://www.youtube.com/watch?v=797jwjqfoT0





A luta da Comunidade Repartimento pelo uso de seus recursos naturais - PARTE 1

Nos últimos anos a comunidade Repartimento dos Pilões passou a se mobilizar para defender seus recursos naturais. A contenda envolve a comunidade e as atividades da Jari Florestal em plantios de eucaliptos e exploração de madeira nativa. Neste primeiro relato, Dilva Araújo, liderança comunitária descreve a comunidade e o conflito existente sobre a terra na região:


"A história da Comunidade Repartimento

F
Foto: Dilva Araújo


Quero contar uma história que muito me chama atenção de uma comunidade chamada Repartimento do Pilão. Em 5 de janeiro de 1960, montados em uns burrinhos por caminho de mata fechada, chegamos neste lugar. Acompanhados de nossos pais –  Sr. Osvaldo Antônio de Araújo e D. Isaurina Almeida de Araújo – e de outras famílias que vinham somente para a colheita de castanha, neste belo lugar que só existiam duas famílias (o Sr. Paraíba e D. Gita, Sr. Raimundo Lopes e D. Joana).

As famílias tinham roças, só tinham algumas plantas de raiz em seus quintais e não havia luz elétrica, era somente lamparina a querosene. Existiam duas estruturas, sendo um galpão de colocar a castanha e a cantina onde os castanheiros ficavam até irem para seus castanhais. Essas estruturas pertenciam ao comprador de castanha, o Sr. Otavio Simplício dos Santos, que morava na comunidade de Paga Divida.

 No final da safra de castanha meu pai e o sr. Jose Santana, resolveram não ir mais embora, aí que começou a agricultura na comunidade. em 1961, já tinham roças com plantios de mandioca, meu pai fazia farinha em um forno feito com duas latas de querosene, enquanto minha mãe moía milho em moinho para fazer cuscuz, complemento de nossa alimentação.

Foto: Dilva Araújo


Em 1962 já havia um morador, porém, ainda continuava ruim, não tinha estrada para irmos para a Comunidade Bandeira, tínhamos que ir montado em burros. No dia 24 de dezembro de 1962, meu pai faleceu... A coisa mais triste que aconteceu, mas mesmo assim, minha mãe e nós continuamos aqui. Em 1963 chegou um Sr. chamado Raimundo Coutinho, juntamente com o Sr. Feliz Matias de Sousa. Eles reuniram os homens que aqui já estavam e abriram uma estrada para que o carro chegasse até aqui. Não existia motosserra, só existia machado e facão, e esse cidadão tinha na época um trator pequeno, que ajudou a fazer a estrada e esse campo que hoje existe aqui na comunidade.

E assim foram se passando os anos e a comunidade foi desenvolvendo os trabalhos de agricultura e extrativismo.  Ai, chegou a vez de uma empresa chamada Jari, que mesmo trazendo alguns benefícios para a comunidade, junto veio muito sofrimento. Tudo era difícil: não podíamos fazer casa, só se fosse com ordem da empresa, pois os seguranças não deixavam e assim por diante.

A comunidade só deu passo melhor com a entrada dos prefeitos. Em 1985, um sr. Alfredo Hage, doou um motor de luz para nossa comunidade, isso foi uma alegria. Logo depois veio a Sra. Marta Feitosa e o Sr. Jaime Boi na Brasa, que presenteou a comunidade com a primeira televisão e antena parabólica.

Hoje graças ao nosso Deus, a comunidade já se encontra com escola, duas igrejas, uma evangélica e a outra católica, cada morador tem seu plantio. Os conflitos nunca deixam de existir, mas também temos uma associação que com muita luta esta organizada. Ah! Quero tirar uma dúvida a respeito deste nome de Repartimento do Pilão: primeiro, Repartimento, por existir um igarapé que se divide em três partes, segundo, Pilão, por ser o lugar de referência para chegar a comunidade.  

E, continuando a historia, quero lhes dizer que hoje, já tem pessoas que se deslocam de seus lugares para habitar aqui, no caso de algumas famílias que vieram de Altamira/Xingu para conseguir a sua sobrevivência neste lugar. Não tinham nada como quando chegamos, mas encontraram uma comunidade com muito mais. Uns vieram com vontade de trabalhar e ajudar a comunidade a crescer, como é o caso do Sr. Eugenio e sua família. Outros vieram somente para gozar do que já tinha e melhorar suas vidas, colocando bar na comunidade, fazendo roçado nas áreas de tradição dos moradores (em castanhais) que somente as pessoas que já moravam aqui utilizavam.

Em nossa comunidade cultivamos: mandioca, milho, arroz, feijão, banana, mamão papaia, também plantamos aqui plantas de raiz como: laranja, pupunha, manga, caju, abacate, acerola, cupuaçu, biriba, açai, cajá, jaca, graviola, noni, coco e jambo, também temos hortaliças: pepino, alface, couve, maxixe, cebolinha, cheiro-verde (coentro), salsa, pimentão, tomate, etc. Temos também criação de animais: pato, galinha, porco, gado, burro, carneiro e picote (galinha da angola).

Então, meus amigos, eu escrevo esta carta para que vocês saibam o que já passamos para chegar até aqui, para que outros venham se aproveitar de nossa luta, gostaríamos que os órgãos públicos entendessem o por que nós pedimos o documento (coletivo) para a nossa comunidade e nos ajudasse a melhorar a nossa tradição, porque somos tradicionais, temos 35 pessoa que trabalham na agricultura e na castanha e outros que só trabalham com a agricultura."
Dilva Araújo, liderança comunitária

Foto: Dilva Araújo


quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Assis e Mendes


Belém, 2006

Outro dia, minha mãe interpelou-me:
- Meu filho, esse trabalho de defender a natureza e da causa ribeirinha é uma luta sem fim! Difícil de vencer. O homem é um tipo muito ruim.
Ao olhar o céu de uma noite pontilhada, contei-lhe que sonhara com São Francisco de Assis encontrando Chico Mendes, lá na sala de espera dos mártires.
Chico indagou ao Chico como foi que o segundo foi parar naquele setor. Mendes, esboçando um sorriso, respondeu que por ganância de alguns fazendeiros de sua terra, tornou-se ameaça e acabou assassinado. Nada mais fizera do que defender seu povo e sua floresta para que houvesse no futuro um povo e ainda uma floresta.
Chico de Assis elogiou Mendes por cumprir sua função na Terra, bom soldado da paz e de Deus. Mendes ponderou que mesmo assim estava preocupado com o rumo que as coisas iriam ter, uma vez que o fato de ter ido embora mais cedo poderia diminuir a resistência de sua luta.
Assis - mirando-o com a severidade de um gavião-real - advertiu Mendes que deixasse a pouca fé de lado e que seu desprendimento não seria jamais em vão. Pedindo os olhos da coruja emprestado, lá de cima Mendes e Assis viram o começo tímido de uma nova era de harmonia entre os homens e a Criação, olhando de dentro para fora de si.
Mendes observava as discussões surgidas após seu martírio. Descartados os pavões, aproveitadores como sempre para se apresentarem como tais, ficaram somente os joões-de-barro com a tarefa de construir uma nova época de convivência. Mendes sorriu mais amplo e Assis balançou a cabeça negativamente, perguntando ao amigo como era possível Mendes acreditar que outros não viriam, determinados, estrelados como ele, talvez não históricos para os demais homens, mas notavelmente registrados no Livro da Vida, da Função.
Mendes concordou que eram muitos os que avistava, semelhantes a formigas em números. Assis concluiu que esse era o único modo de incomodar Tamanduás maiores e mais poderosos que as comeriam se não se juntassem. “A natureza é sabia”, definiu. Deus é sábio.
- Meu filho, tomara que um dia isso tudo se torne verdade.
Disse a minha mãe:
- Então olhemos com mais carinho para as formigas.



terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Aos Vendedores


                        



Foto: http://g1.globo.com/brasil/blog/caminhos-do-brasil-caravana-g1/post/chopp-de-fruta-no-para.html 
Belém, 07 de novembro de 2014.

VEM AQUI QUE É DO BOM!!
VEM AQUI QUE É DO BOM!!

Saquinho plástico
Nó bem na ponta
Jarra de suco
Perdi já a conta
Congela o dedo
Frio que tem dor
Altura alça
De um isopor
Fruti os sabores
Diversa a cor

Eu hoje matei seu calor
Que alívio frescor

VEM AQUI QUE É DO BOM!!
CHOPP DE AÇAÍ!
MINHA CUBA FAZ ATÉ SOM!!
O MEU DIA CUMPRI!

Novo jambu
Goma fervente
Fogo aceso
Panela quente
Queima o dedo
Suporta a dor
Cuia limpinha
Serve o senhor
Camarão rosa
Sinta o sabor

O lábio tremeu da mistura
Tucupi da loucura

VEM AQUI QUE É DO BOM!!
TACACÁ DA ESQUINA!
PRO ENCARGO TENHO O DOM!!!
PROVA UM POUCO MENINA!

A bananeira
Empresta a folha
Leite dois tipos
O doce e nem tanto
Coco ralado
Marca da dor
Pano à cabeça
Faça um favor
Baixa a caixeta
Tampa incolor

Macia pra tu merendares
Pro café que preparaste

VEM AQUI QUE É DA BOA!!
TAPIOCA, VIZINHA!
MINHA VOZ LONGE VOA!!
SIGO A LADAINHA!

A molecada segue a buzina
Cheiro de margarina

VEM AQUI QUE É DO BOM!!
TENHO QUENTE PIPOCA!
PRO PASSEIO COM O AMOR!!
OU FALAR DE FOFOCA!

VEM AQUI QUE É DA BOA!!
ESSA VISTA DO DIA!
ESSA GENTE FORTE PESSOA!!
VEJO A POESIA!
Pantoja Ramos.
http://www.recantodasletras.com.br/poesias/5042744


sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Transparência para as crianças










Alto Rio Pacajá, Portel.Foto: Carlos Ramos.








Belém, pensando no Rio Ituxi, 21 de Novembro de 2014.

(atualizado em 22 de março de 2017).




Neste mundo de Deus, a Terra é muito Água, diria eu. E na memória que vi dona Maria Lúcia a lavar suas panelas lá no rio Jaburu, em Gurupá, percebi a cumplicidade forte entre aquela amazônida e a água, tão acostumadas uma com a outra no dia a dia. Mas sendo elas cordiais reciprocamente, como pode haver desconfiança? 

A desconfiança da água é a poluição que faz o homem em volume cada vez maior, de dejetos que conseguem matar um rio inteiro. A condição humana boiando fétida nos canais de nossas cidades. Do garimpo longe, mas que inevitável é o mercúrio corroer os peixes e os neurônios das gentes que nada tem a ver com a cobiça de outros poucos evoluídos, por uma pedra na versão humana mais valorosa que a água, a fonte da vida.

A desconfiança da mulher é reparar que a água bebida por sua família tem cor, tem cheiro e é bastante pesada a acumular o barro no fundo dos copos. Que não pode conter a diarreia frequente de sua meninada por não saber como tratar a água de maneira eficiente. Sua intuição apita para o perigo, mas faltam as condições para lidar com o apuro. Algumas mais sabidas coletam água da chuva, não confiam nos rios.

Nas décadas de 1980 e 1990, o cólera foi um fantasma a escorrer pelos rios e igarapés na região Norte do Brasil. Lembro dos noticiários. Do medo dos moradores da floresta. Movimentou-se a sociedade e o governo. Anunciou-se o hipoclorito. Diminuiu-se o mal. Contudo, não se criou uma nova mentalidade coletiva de cuidar de nossos recursos hídricos de maneira taxativa.

E assim, no século XXI, impressionando o famoso economista Eduardo Giannetti, o Brasil tem avanços econômicos de século XXI e vanguarda, mas com problemas sociais de século XIX. Para os cidadãos que se incomodam cada vez que surge uma nova obra faraônica e inócua feita no Brasil: não é possível uma criança beber água de má qualidade! Assim como não é possível o Governo Federal destinar em 2016 apenas 0,02% de seu orçamento* para custear o saneamento básico brasileiro, o que diretamente rebate na qualidade da água potável.

É inapropriado dizer Brasil entre os 20 mais ricos do mundo, quando escolas não tem água para matar a sede de seus estudantes.

É inadmissível.

Dois baldes de margarina vazios. Duas velas de filtros. Uma torneirinha. O hipoclorito. Eis o filtro Rafaela. Apelidei de filtro Rafaela tal utensílio por surpreender-me com a simplicidade com que a enfermeira Rafaela Dumont ensinou famílias a fazer filtros que custam, no máximo, 35 reais, quando dos trabalhos que fiz em Almeirim pelo Instituto Floresta Tropical.

Não sei se você inventou isso amiga Rafaela, mas seu filtro hoje em dia cuida das pessoas.

Depois do que vi, não consigo conceber uma criança maltratada pela água.

Maltratada pelo descaso.

Maltratada pela inversão de valores.

Criança é o cúmulo da vida.

Água é vida.

Criança e água numa transparência só.












Almeirim, Pará. Foto: Carlos Ramos 






(*) Segundo estudos da ONG Auditoria Cidadã - http://www.auditoriacidada.org.br/


sábado, 15 de novembro de 2014

Ei Balsa!


      “Da Lama ao Caos
       Do Caos à Lama
       Um Homem Roubado
       Nunca se engana...”
       Chico Science & Nação Zumbi – Do Caos à Lama



     




   Baía de Melgaço, 01 de novembro de 2014.

Voou a tesoura
Pra longe da queda
E uma preguiça caiu no rio
Rasgou o cipó
Com a minha vida
E jovens foram caindo um a um

Ei Balsa! Ei Balsa! Balsa volta aqui!
Que levas? Que levas? Que levas daqui?


Levas o que tenho!
E o que não tenho!
Rico lenho!
Pobre venho!
Pobre massa!
Não mais caça!
Longe passa!
A ricaça!
Tira graça!
Lá da balsa!
Nota falsa!
Velha valsa!



Faltou-me abrigo
Pouca parede
E hoje choveu na minha rede
Mal tenho casa
Ralo assoalho
E um morcegão visitou minha filha

Ei Balsa! Ei Balsa! Balsa volta aqui!
Que levas? Que levas? Que levas daqui?

Toram tudo!
E futuro!
Se apuro!
Testa um furo!
É o sistema!
Que condena!
Tem um lema!
Pobre pena!
Rico encena!
Na novena!
Reza ao esquema!
Mete a lenha!

Mil angelins
E um bocado
De louro-faias que quase não vejo
Tão nobre ipê
Vai humilhado
Vendido por uns parcos trocados

Ei Balsa! Ei Balsa! Balsa volta aqui!
Que levas? Que levas? Que levas daqui?

Maçaranduba!
Cupiúba!
Itaúba!
Minha culpa!
Timborana!
Piquianara!
Quanta grana!
Cedrorana!
Mata rala!
Medo cala!
Surge a mala!
De mudança!
Tem Mudança??
Tem Mudança??
Tem Mudança??




















Pantoja Ramos

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Metade da riqueza mundial pertence a 1% da população, diz relatório

O tempo passa e isso não muda...

Será o Homem justificável eu me ponho a perguntar... Ei cabra, alerta pro dia: tua esperança por justiça é o que te renova!


Um dia esta balança equilibra. Lutemos!


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O 1% mais rico da população detém mais de 48% da riqueza mundial, que cresceu 8,3% de meados do ano passado a meados deste ano.
De acordo com relatório do Credit Suisse sobre o assunto, em 2014 o total da riqueza no mundo bateu um novo recorde, alcançando US$ 263 trilhões.
No documento, o banco diz que o valor já é o dobro do registrado em 2000, "apesar do ambiente econômico desafiador", marcado pela crise econômica e pela lenta recuperação dos países.
A criação de recursos foi particularmente forte na América do Norte, com um crescimento de 11,4% entre meados de 2013 e meados de 2014, e na Europa, onde a alta foi de 10,6%. Nas duas regiões, o mercado de capitais foi o principal impulsionador.
Nos mercados emergentes, a Ásia –com destaque para a China– foi a principal responsável pelo aumento de riquezas, assim como no ano passado.
"No entanto, achamos que o crescimento das riquezas no mercados emergentes não foi capaz de manter o seu momento pré-crise, entre 2000 e 2008. Isso não deve nos distrair do fato de que a riqueza pessoal na Índia e na China cresceu pelo fator de 3,1 e 4,6 desde 2000."
DESIGUALDADE
Segundo o relatório, uma pessoa precisa de US$ 3.650 para estar na metade mais rica do mundo. Para ser membro dos 10% mais ricos são necessários US$ 77 mil. Já para fazer parte do 1% mais rico é preciso ter US$ 798 mil.
O mínimo de recursos para pertencer ao 1% mais rico cresceu desde a crise de 2008. Naquele ano, eram necessários US$ 635 mil, contra US$ 798 mil hoje.
Por sua vez, a riqueza média global tem diminuído desde 2010.

"Esses achados indicam um aumento da desigualdade global nos anos recentes. No entanto, nossos resultados sugerem que a tendência inversa ocorreu no período que antecedeu à crise financeira."
http://www.portaldomeioambiente.org.br/ecologia-humana/9586-metade-da-riqueza-mundial-pertence-a-1-da-populacao-diz-relatorio

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Fundos Florestais Comunitários: o Fundo Açaí da Comunidade Santo Ezequiel Moreno, Portel-Pa

Ponte da Comunidade Santo Ezequiel Moreno. Foto: ATAA

A comunidade Santo Ezequiel Moreno é uma das 17 comunidades existentes no rio Acuti-pereira, no município de Portel, Marajó, Pará. Com o Plano de Uso dos Recursos Naturais, elaborado para o rio em 2006 com assessoria do STTR de Portel e ONG FASE, as 15 famílias de Santo Ezequiel iniciaram o processo de transformação e luta pelo uso legítimo da terra, tendo como base a observância aos princípios do manejo florestal e dos recursos aquáticos.

A primeira mudança ocorrida a partir do plano de uso foi o impedimento da invasão de cortadores de palmito na região e o aprimoramento dos moradores em técnicas de manejo de açaizais. Estas duas ações foram fundamentais para a conservação dos açaizais nativos e aumento da produção de frutos de açaí na comunidade, que a coloca atualmente como uma das mais produtivas de Portel.
Igarapé local. Foto: ATAA

Segundo informações relatadas por lideranças locais quando da avaliação do plano de uso do rio Acutui-pereira em 2013, no período de 2006 a 2010 a produção de frutos de açaí cresceu ano a ano, passando de 15.600 latas para 23.000 latas. Em 2011 por conta dos trabalhos de manejo florestal nos açaizais nativos, onde foi necessário aplicar operações de desbaste nas palmeiras, houve decréscimo da produção, talvez influenciada pelos desbastes de açaizais, produzindo-se para comercialização 12 mil latas. As projeções dos comunitários, porém, apontam para uma tendência a recuperação a partir de 2012.

O aumento da produção de açaí e o aparecimento novamente de animais silvestres para alimentação e pescado permitiram à associação local o início de um processo de autonomia, tendo como base a valorização dos recursos naturais prevista no plano de uso. Mais do que isso, conseguiram gerar um fundo a partir da produção florestal iniciado em 2012.
Vila da comunidade Santo Ezequiel Moreno. Foto: ATAA
Neste ano citado, a Associação dos Trabalhadores Agroextrativistas do rio Acuti-pereira (ATAA), entidade que representa Santo Ezequiel e outras comunidades da região do Baixo Acuti-pereira, inovou ao organizar ao longo da safra do açaí a arrecadação para o coletivo tendo como princípio a doação de 1 real para cada lata de açaí comercializado pelo moradores. Como exemplo, quando um trabalhador vendia 10 latas, deixava com a tesouraria da associação 10 reais para o fundo comunitário, cujo controle é feito através de anotações em cadernos. Em dezembro de 2012, a ATAA tinha arrecadado algo entorno de 12 mil reais com as doações, cuja aplicação dos recursos financeiros, votada em assembleia, destinou-se para:
  • A construção da ponte da comunidade, interligando a vila à área de plantio das famílias em terra-firme, com 600 metros de extensão;
  • A ampliação da sede da ATAA;
  • A estruturação da comunidade quanto ao abastecimento de água (700 metros de encanamento);
  • O apoio a viagem das lideranças para capacitações;
  • O investimento em outros produtos agrícolas e agroflorestais como hortaliças, legumes, mandioca, fruticultura (bacuri, taperebá, abacaxi) e no próprio manejo de açaizais e de espécies florestais como a andiroba.

Em 2013, o volume arrecadado foi de 11 mil reais, cujo montante foi investido na reforma da capela local e no fortalecimento da agricultura para alcançar os mercados institucionais de PAA e PNAE da CONAB. Para Teofro Lacerda, uma das maiores lideranças do rio Acuti-pereira:

Teofro Lacerda, presidente da ATAA. Foto: IEB

O fundo florestal do Acuti-pereira é importante por que tem gerado certa independência aos governos, nos permitindo a construção de pontes, contribuindo na compra de materiais para nosso sistema de captação de água e até mesmo ajudando no atendimento aos doentes. Esperamos aumentar cada vez mais este fundo, trazendo recursos de outras produções da agricultura familiar como a macaxeira, a melancia, abóbora e milho”.
Teofro Lacerda, liderança da comunidade Santo Ezequiel Moreno.




Para 2014, a estimativa é que o Fundo Açaí gere uma arrecadação final de 20 mil reais, a partir da poupança de R$2,00/lata de açaí vendida por cada família.

domingo, 28 de setembro de 2014

Um dia na vida de João Impigem de Oliveira Pano Branco


                                Belém, 20 de setembro de 2014.


Mulher me trocou por outro alguém
Na rua minha mala jogou
Perdi do meu bolso uma nota de cem
Japiim na moleira cagou

Tropecei bem na unha encravada
Rasgou a rede puída
Toalha caiu dentro da privada
Estourou a minha nascida

Rasa de açaí vi tombar no rio
Na perna fisgou uma arraia
Hoje me estranhou o cão que crio
Cordão me roubaram na praia

Queimou o meu rádio novinho
Um raio veio no telhado
Comboia topou-me no caminho
Feijão eu comi bem queimado

Eu subo no barco que construí
Rezo bem alto em mim
Dedico todo o meu sorrir
O mal sempre tem um fim
Pra um obrigado um florir
Uma criança eu vi
Tudo que valha em si
Minha força vem de Ti

Polícia achou que era bandido
Livrei-me, mas ainda apanhei
Ao abrir a boca engoli mosquito
Da estiva da vila eu despenquei

Pisei na rama do murumuru
Morcego mordeu-me a orelha
No porre dormi com um mutum
Rasparam-me a sobrancelha

Ex-sogra disse que eu não prestava
Cunhado deixou um prejuízo
A rasga-mortalha me agourava
Doeu-me o dente do juízo

O barco encalhou na vazante
Na terra das carapanãs
Um breu é o que vejo adiante
Pousou no meu ombro chicuã

Saia fora e voa pra os teus
Não acabas com sonhos meus
Não terei a morte daquele Orfeu
A Santa já intercedeu
Escritura que me valeu
Motivo do amor comoveu
Se ainda não convenceu
Eu teimo sendo de Deus.

Pantoja Ramos.
http://www.recantodasletras.com.br/poesias/4971248


sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Ao IFT Núcleo Altamira

Após 16 anos de vida profissional com comunidades tradicionais, esta consultoria voltou novamente a motivar-se para a luta por direitos socioambientais na mesma intensidade quando dos primeiros trabalhos em Gurupá, no início dos anos 2000. Impressionante constatar que mesmo após tanto esforço para colaborar na consolidação dos processos fundiários em favor de famílias agroextrativistas, regiões como Almeirim ainda buscam a segurança a terra em seu reconhecimento, princípio básico de cidadania do campesinato. Parece que tal município esteve no limbo, alheio e alienado à toda conquista obtida na Amazônia em relação aos territórios dos povos da floresta.

Da mesma maneira, surpreendente fora o despertar de um grupo de lideranças que resolvem transformar este questionamento, tardio, porém necessário, em uma rede intercomunitária. Forte e insinuante, a RICA hoje se coloca como uma alternativa de reflexão em uma região dominada pelo modelo empresarial que não colaborou muito a agricultura familiar. A pergunta estava adormecida, o IFT em sua nobre equipe só ajudou que as comunidades levantassem a mão para indagar.

E indagaram. E questionaram. E protestaram. E nunca mais serão os mesmos. Direitos constitucionais são agora buscados, tendo o Ministério Público Estadual a sua voz para equilibrar as forças, historicamente descabidas para o lado de quem tinha condições de pagar um corpo jurídico para manter a situação em quase 40 anos de história.

Este consultor agradece à equipe do IFT pela renovação profissional enquanto cidadão. Somos antes de tudo, isto, pessoas, não máquinas como diria Chaplin. Trazer a esperança da liberdade à alguém é descobrir a América novamente. Indignar-se com uma casa derrubada pelo grande capital é relembrar porque alguns profissionais nasceram para servir a sociedade. Para estes, a ideia de horas/ dia não cabe. Só o que cabe é a justiça, atemporal e espalhada no horizonte. Mas só a enxergam aqueles que têm fé.

Obrigado pela fé.

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Pai Zezão


                           Macapá, 21 de julho de 2014.

Pai Zezão sempre foi um grosseiro patriarca. De fala direta e franca, comandava com bengala de acapu aquela ilha no meio do rio Amazonas, no trecho entre Almeirim e Monte Alegre. Cambado de um lado da perna pelo beijo de um surucucu ainda moço, trazia a dor estampada no rosto que muitos viam como mau humor, porém era simplesmente a somatória das experiências vividas principalmente de ruim, e seu sonoro huuuummm era sinal de concordância ou serenidade diante da situação posta. Nunca dava pra saber se era a primeira ou a segunda ou as duas coisas juntas.

O velho tinha seis filhos, sendo quatro rapazes e duas moças, todos trabalhadores e disciplinados, a exceção de Percivaldo, conhecido ali como Chumbinho, dada a mania de caçar desde molecote. Chumbinho tinha uma revolta nascida dentro dele mesmo, sacudida pela família sempre pedindo para estancar a vadiagem e a zarulhice, talvez acostumado que era ao receber os bons tratos do fato de ser o caçula. Realmente, de Pai Zezão foi o que recebera a menor quantidade de carinhos de cinta de couro. Até quando apanhou, não foi em declarações de pausa silábica do por-que-você-fez-aquilo. Uma rapa aqui e acolá, esquivando a maior parte da costa por ser o preferido. Pai Zezão com ele era mais carinhoso. Os outros reclamavam da falta de critério do pai. “O Chumbinho faz o que bem qué e nunca leva o dele de verdade...”, protesta a mais velha. “Vem cá moleca que eu vou tê mostrá o teu que tá querendo!!”. E sova.

Esses episódios não eram a dinâmica daquela relação, não: na maioria das vezes bastava Pai Zezão olhar feio e bater a bengala de acapu no chão para todos já ficarem de sobreaviso e deixar de pavulagem. Assim era quando pediam pra ir às festas, quando queriam enrolar mais uns minutos na rede antes de ir pra roça, quando tinha visita em casa, quando era a sexta-feira da Paixão.

Já adultos, as mulheres casaram-se todas, os homens também a não ser Chumbinho. Viviam todos na mesma posse, com a influência de criação do patriarca não perder uma braça que fosse.

Um dia Pai Zezão tava escamuchando o dedão inflamado da unha encravada deitado na sua rede no salão da casa quando chega o Salatiel, filho do compadre Arnô. “Bença padinho”. “Deus te dê boa sorte”. “Padinho, o pai quê falá com o senhor sobre uma situação que aconteceu com a Verinha”. “Diga pra adiantá, é só com ele?”. “Sim senhor.”. Pai Zezão botou a camisa no ombro o que para ele significava já estar vestido, calçou a percata e já na saída lhe chega a esposa, Dona Ana, a antecipar a conversa com o compadre Arnô. “Homi, que vergonha, a Verinha tá prenha e tão dizendo pur aí que é do Chumbinho...”. “Comequié??!”. Nem contou conversa e foi para o campo de muinha onde o Chumbinho, nos seus vinte e dois anos de idade se preparava para bater um pênalti. No que se virou e viu o pai ainda tentou correr, mas foi enganado pela destreza do velho ainda capaz de dar um salto certeiro em qualquer cutia que bobeasse e assim trouxe o rapaz com o polegarzão travado na orelha. “Vem cá moleque que eu vou tê ensiná a ser homi de respeito pra num andar com a filha dos outro de família, molequi!”.

E no mesmo dia, já estava a capela, a noiva, os pais da noiva, até o padre que estava uma hora e meia de barco visitando uma ilha vizinha, tudo pronto para casar Verinha e Percivaldo Chumbinho. Ela num misto de sem graça e alegre. Ele todo amuado de cabeça baixa. E foram casados quase à meia noite pelo padre Rafael. Enquanto rolava o casório, de Pai Zezão se ouvia: “huuummmmm”.

Quinze anos depois, Chumbinho andava meio bebedor, hostil com todos até chegar ao cúmulo de bater em Verinha só porque perguntara onde estava o dinheiro do açaí que tinha vendido. Violentou a coitada até arroxear os dois olhos, vazios de vida que ficaram por sete dias. A notícia não tardou a chegar ao Pai Zezão, que contava os altos de seus setenta anos. “Ispia, pai, o Chumbinho porre bateu ontem de noite na Verinha”. O velho saiu no terreiro, passou pelo casebre e ainda viu a senhora humilhada na rede que mal balançava pra não trazer mais dor. Ao lado do jirau em pé estava Chumbinho e sua garrafa de cachaça a proferir impropérios para o pai. “Sai daqui velho, que sou homi agora e faço o que eu quiser nessa porra!”. Pai Zezão pegou a bengala tremida e deu com a curva da madeira na costa do filho rebelde, bastando duas porradas pra arrancar o ai-ai-ai do bebum, que logo se acocorou no canto da cozinha. “Quero vê se tu é homi de batê em macho de verdade. Tu é o valentão pra batê em mulhé, então toma o teu!!”. Rachou o supercílio de Chumbinho, que botou as mãos e cotovelos para proteger a cabeça embriagada. “Enquanto tu morar debaixo do meu sobrado, tu não manda nada aqui viu, molequi! Bate de novo na Vera, bate, que eu parto tua cabeça que nem um babaçu!”.

O evento marcou a ilha e fez de Chumbinho um cidadão aparentemente correto, até melhorou na lida diária, um comportamento que já não lembrava mais a bebedeira, e fez o pilequento largar a farra escondida com as mulheres trazidas nas geleiras pelos pescadores de Abaetetuba. Tudo em ordem que tirava de Pai Zezão ao ver Percivaldo carregando rasas de açaí o som de “huuummmmm”.

Cinco anos depois, Pai Zezão morreu. Foi-se devido a uma veia estourada na cabeça que não deu chance de se despedir dos filhos. Neste pé  Chumbinho voltou ao vício da bebida.

Bebeu a roça boa que tinha. Bebeu a embarcação que antes era limpa e rápida para os padrões locais. Bebeu o resto da casa que estava se ajeitando. Bebeu até o amor da esposa que não aguentando mais a ausência do marido, chamou a todos para uma audiência familiar. E disse aos cunhados ajuntados no salão: “Gente, antes de eu botá uma galhada na cabeça do Chumbinho, que não me dá carinho, não me procura, nem pára sequer na sala, só no jirau bicando buchudinha e mais buchudinha, eu prefiro dizer pra vocês que é melhor a gente seguir cada um pro seu rumo”. Todos escutaram e concordaram que talvez fosse o caso. De um a outro, surgiam huuummmm. “É isso que tu qué?”, perguntou o irmão mais velho. “É melhó”. E assim foi. Chumbinho, lá perto do Jirau nem fez questão de tentar entrar na reunião e dizer que iria mudar, que Verinha deixasse disso e que tudo seria melhor daqui pra frente. Só abraçou mais ainda a garrafa que dizia a ele que ao contrário daquela mulher, jamais o abandonaria.

Bêbado, largado, feridento, não falando coisa-com-coisa, Chumbinho passou a viver do coração bom das pessoas e dos irmãos, apodrecendo que nem a morada que lhe sobrara, fartando os cupins que ali se multiplicavam. Verinha, por sua vez, por consideração ao sogro passou a mandar religiosamente uma quantia em dinheiro para que Chumbinho não morresse de fome. Quando perguntada por uns dos filhos o que o vovô Zezão diria daquelas cenas de desolação, Verinha apenas balbuciou:

“Huuummmmmmm”.
Pantoja Ramos
http://www.recantodasletras.com.br/cronicas/4891927

segunda-feira, 14 de julho de 2014

Solar


                                      Melgaço, 12 de julho de 2014.


Solar
Ouvi que dava certo
Mas dá medo agir
A ideia estava perto
O óleo a me iludir
Melhor manter-me quieto
Intuição vou fingir
Escuro ficou descoberto

Voltei-me para o céu
O que queres me dizer?
Minha mente a revolver
Deve ser solar

Solar
Tão claro como a água
Energia que implante
Dos seres excitante
Arrisco um palpite
Vejo o Homem bem mais livre
Mas sendo solar

Solar
Sem lares afogados
Sem pulmões esfumaçados
Sem gritos amordaçados
Com a benção do Rei
Viveremos novo dia
Vira lastro alquimia
Gente sim solar

Solar
Comum para meu neto
Rotina a luzir
O Sol à Lua inverso
Recarga barco partir
Independente correto
A consciência seguir
Larga a ganância, alerto

Pensa caboclo que veio o tempo
Na voltagem do querer
Na amperagem do saber
Do que é solar

Solar
Tão óbvio o circuito
A lâmpada brilhante
Vê do espaço o migrante
Que lá de cima aviste
Da ciência que existe
Terra é solar

Solar
Com fios conectados
Ao invisível irradiados
Saturno e Órion plugados
São ligados ao infinito
Ciclo fim que inicia
A galáxia bateria
Fonte do solar
Pantoja Ramos
http://www.recantodasletras.com.br/poesiastranscendentais/4881562