Belém, 15 de setembro de 2015.
Em agosto fui ao município de Chaves, no Marajó,
por conta de trabalhos relacionados à elaboração de planos de uso dos recursos
naturais para comunidades locais. Um instrumento de bom uso da mata, dos rios e
de convivência entre vizinhos, que ensina muito àqueles que assessoram as
famílias neste debate. Afinal, não se pode opinar tecnicamente sem vivenciar o
dia a dia do agroextrativista. No caso de meu aprendizado, tive que admitir que
nossa educação é excludente, errada em
sua estratégia em consolidar a figura de cidadãos de fato, de Ribeiros, não
mais ribeirinhos, pois diminutivos não somos, nem nunca fomos, só nos apelidam
na grande maioria das vezes os de fora. Sei que não é nada de novo, mas
incomodou-me o estático da ciência. Deparei-me
com o não conhecimento de um trabalhador rural de Chaves em como calcular madeira em metragem cúbica ali de sua serraria, tal qual verificava em Gurupá, no início
dos anos 2000. Como deveria saber este senhor sobre a forma de comercialização de
madeira processada mundo afora! Como fica este à margem em relação aos que muito ganham! Na soma de argumentos sobre tal estado,
resolvi lançar três historietas matemáticas para avaliar nossa formação escolar,
no afunilamento de questões florestais madeireiras como estudo de caso.
O primeiro caso que aqui exponho foi a compra durante muitos anos de madeira da espécie ucuúba (ou virola) por uma empresa japonesa em região gurupaense. Um dia me foi perguntado por uma liderança, seu Codó: “Carlos, o que é o volume Francão??”. “Volume Francon”. “É, este mesmo.”. “porque a firma que compra madeira da gente só paga desse jeito, no Francão”. Na tentativa besta de ser o mais didático que pudesse ser, expliquei que: “imagine uma tora de madeira, roliça. Quando medido seu volume, digo que é volume real de uma tora, considerando o que de fato ela é”.
Codó concordou com a lógica e assim continuei: “imagine agora que esta tora de madeira, roliça, seja cortada onde se aproveitasse a grande parte quadrada (na intenção minha de fazer-me entender), retirando as costaneiras, assim ó...”:
“Este é o Volume Francon”. Codó passou a mão na
barba branca e pediu que eu repetisse tal explicação após o culto de domingo.
Apresentei o raciocínio à comunidade, e na expressão de seus olhares, captei o
incômodo geral. “Vocês vendem virola pra quem?”. “Para a firma japonesa que vem
lá de Breves”, responderam. “Pra quê ela precisa de virola??”. “Pra fazer
compensado, né?!!”. “Como a máquina que faz compensado trabalha??”.
“Laminando!”. “A Máquina corta??”. “Não, a máquina desfia!”. Foi assim que
definiram a laminação de madeira para compensado.
“Fiuuuuuu”.
O assobio solitário de um dos presentes ressoando
no salão foi o sinal de mentes trabalhando. Desenhei com o dedo no ar para
bater de carrão de sena. “Como a firma compra de vocês?”. Fiz a misura:
“Como a máquina desfia?”. Continuei na misura:
“Como a firma paga vocês??”. Uma das lideranças
desenhou no ar:
“Égua! Tão roubando a
gente faz tempo!!!!”.
A partir de então exigiram
que o japonês que visitava a vila pagasse o volume real e não mais o tal volume
“Francão”, pra surpresa do comprador após tantos anos. Mas o que a educação
básica tem a ver com isso? Simples. Geometria. Básica geometria que poderia ser
bem ensinada na escola. Ah, ia esquecendo, Codó e sua comunidade passaram a
calcular volume de toras assim:
VOLUME REAL DA TORA = CIRCUNFERÊNCIA (metros)
X CIRCUNFERÊNCIA (metros) X COMPRIMENTO (metros) ÷ 12,56.
Tudo isto para chegar
mais próximo da verdade para os Ribeiros...
(Continua...).
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