sábado, 29 de dezembro de 2018

Crônicas, Passageiro: Começais


Terminal Rodoviário de Belém do Pará. 

Terminal.

Terminal é um nome estranho naquilo que agora enxergo. Parece mais um começo, não terminal.

Empresa de Ônibus Interestadual Boa Esperança. Ué? Existe má esperança? Do que escuto desse substantivo-sentimento, sempre é referido como aquilo de bom que há de vir. De um mundo em que 1% dos mais ricos detém a mesma riqueza financeira dos demais 99% e todo o flagelo que isso acarreta, só posso ter na Esperança o intrínseco que seja bom o futuro como obviedade.

Guanabara. Outra empresa. Palavra que significa em tupi-guarany "baía" ou "seio mar"[1], também abrangente para todo o Nordeste e não somente à baía mais famosa do Brasil, no Rio de Janeiro, raciocínio que tive a partir das rotas desta linha rodoviária, tal qual outra empresa, Rápido Marajó.

Rápido Marajó? Não recordo de tal empreendimento em minha região de origem, mas pudera, é nome comercial que pega fácil em qualquer rincão deste país, por mais que esteja longe de nossas maresias. E lá vai o Rápido Marajó para o Maranhão, Goiás, Tocantins, Minas Gerais até chegar em Campinas, destino final. Tudo percorrido em cidades dos interiores, coerente com o que é Marajoara, igarapés não, mas estradas. Gurupi, Porangatu, Rialma.

Rialma? Como se dá um nome desse pra um município? Talvez fundadores (aqui em um chute meu), no pioneirismo até de inaugurar nomes, chegaram à conclusão de que tudo estará bem no outro plano desencarnado, onde não haveria tristeza, alegre-se! Rialma! Rialma! Pronto. Achei o argumento que faltava para explicar que só pode haver Boa Esperança se alma em sua evolução sorrir, portanto, redundante aplicar à palavra que os grandes homens inspiram e proferem de suas bocas ser boa ou ruim.

Ônibus Itaperimim de Belém até Campos, passando por Salvador, terra próxima onde moram meus irmãos e minha mãe. Saudade deles, porém, uma saudade sem adrenalina neste instante. Não vou viajar. Apenas parei para lanchar uma fatia de pão caseiro, aproveitando para anotar a esmo tais linhas. Os que aqui estão na maioria a viajar certamente devem ter a saudade realmente desperta. Ou vão ao encontro de alguém, matar saudade; ou vem chegando de algum lugar trazendo saudade. Neste tempo que decorre por chão, é tudo mais mastigado, bem pior do que avião (que paira por cima da realidade, mecânico acima de tudo), nem tanto quanto viajar de barco, disso eu sei por experiência.  Olha-se para a estrada por horas, trepidantes pensamentos, amortecidos pelas lombadas e freadas, memórias do último café com seus amados amigos e parentes, a conversa, o Natal aconchegante. E também será de expectativa apreciada pela janela embaçada pela chuva daqueles que vem. Como eles estão? Emagreceu? Engordou? Tá mais velho? Se curou? Prosperou? Aquele cuscuz... hummm.

Eu, sentado, observando as placas das empresas de ônibus e as pessoas se movimentarem, permaneço nem ex-ante nem ex-post em relação aos efeitos de encontros e partidas, e sim num outro nível sentimental na percepção einsteiniana que o tempo é algo precioso.

Terminei minha merenda. Hora de partir. Para cada qual, um pedaço de Esperança eu reparto. Para os novos dias deste calendário repleto de novidade e de novas saudades.


Nunca terminais.


Começais.




Feliz Ano Novo.





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