Foto: Suane Melo
Em 2008, o Governo Federal
instituiu o Programa Territórios da Cidadania, coordenado pela Casa Civil da
Presidência da República, classificando o Marajó como uma marca territorial. De
fato, a centenas de anos os habitantes da região se reconhecem como marajoaras,
identificação esta formada ao longo dos anos pelos distintos sistemas agrários
que prevaleceram no Marajó, desde os Sistemas
Indígenas (Schaan, 2004)[1],
até o classificado como Contemporâneo
(Souza, 2013)[2],
passando pelos sistemas Agrário Colonial
e da Economia da Borracha (Souza,
2013). Em comum a todos, a forte ligação das atividades humanas a mercê da
abundância ou escassez de produtos florestais, agroflorestais e aquáticos. Desde
1950, este processo tem sido mais emblemático, como no exemplo do ápice e
derrocada da indústria madeireira e do palmito, o que marcaria um Sistema Agrário da Indústria Predatória,
como o próprio nome já indica, caracterizado pela falta de planejamento e sobre-exploração
dos recursos naturais, favorecendo pequeno grupo de pessoas.
Historicamente esta região tem
sofrido com a ausência de investimentos em infraestrutura, notadamente
transporte e energia, dificultando a promoção do desenvolvimento em todas as
suas dimensões. Isolamento geográfico/espacial, estagnação econômica e subdesenvolvimento
político são as características que configuram a condição de abandono e pobreza
do Marajó no momento atual. Mesmo os investimentos feitos no Marajó serviram
para enriquecer financeiramente a poucos, em detrimento dos trabalhadores
rurais e urbanos. Tal negligência estatal e mesmo da sociedade em geral por
séculos acabam por manter os números de IDH e PIB como dos piores do país.
Foto: Instituto Peabiru (adaptado)
A oficialização de Território
Tradicional e Povos/ Comunidades Tradicionais a partir do Decreto Lei 6040, de
07 de fevereiro de 2007 reforça a ideia de um Marajó diferenciado: de possuir
ribeirinhos que aparecem em sua origem como seringueiros, castanheiros,
pescadores artesanais, indígenas além dos remanescentes de quilombos e tipos humanos reconhecidos pela ciência como
no caso do vaqueiro do Marajó (Boulhosa, 2007)[3]
e dos peconheiros (extratores de açaí – Silva et. al, 2011 )[4].
Todos os citados anteriormente têm no uso da natureza a sua sustentação,
influenciando decisivamente na socioeconomia histórica dos municípios marajoaras
e capitais como Belém e Macapá. É neste contexto que o fortalecimento de áreas
humanas, exatas, agrárias e biológicas deve encontrar campo fértil para
continuar gerando novos estudos e descobertas.
A base desta nova plataforma científica
pode estar na corrente mudança que vem ocorrendo desde 2002, com o início da
regularização fundiária em ilhas da região, quebrando uma estrutura agrária que
não reconhecia a posse das comunidades tradicionais. A cessão de uso gratuito da Ilha de Santa
Bárbara pela União aos moradores locais (2002), a criação do Assentamento
Agroextrativista do Camutá do Pucuruí (2001) e a criação dos Remanescentes de
Quilombos (2001), todos em Gurupá deram origem à uma enxurrada de debates sobre
regularização fundiária no Marajó. Graças a estes primeiros avanços, criaram-se
as Reservas Extrativistas em 2006 do Mapuá (Breves), Terra Grande Pracuúba
(Curralinho/ São Sebastião da Boa Vista) e Gurupá-Melgaço, a 1ª Reserva de
Desenvolvimento Sustentável Federal (chamada Itatupã-Baquiá, em Gurupá) e a
partir de 2007, inúmeros Projetos de Assentamentos Agroextrativistas do INCRA e as milhares de emissões dos Termos de Autorização de Uso da SPU, indicando
desta forma os processos de segurança da terra em favor das populações
tradicionais como um novo Sistema
Agrário Contemporâneo.
Foto: Secretaria Municipal de Curralinho
Na observância dos ciclos
agrários apresentados que tem como fundamento a sobrevivência do homem e da
mulher marajoara a depender dos recursos naturais que dispõe, é o Marajó um
território que precisa ter o desenvolvimento científico voltado para estas
características. De políticas públicas que aperfeiçoem as tecnologias
industriais a respeitar as regras de resiliência dos ecossistemas regionais. De
consolidar a economia gerada do Marajó menos especulativa e mais produtiva para
o bem estar da população, geradora de renda e ocupação a enfrentar os riscos
sociais. De aplicação das diretrizes globais de aperfeiçoamento humano pautados
nos objetivos do milênio. De uma agenda educacional baseada na realidade vivida
por cada estudante do Marajó, seja morador da região dos campos, das florestas
de várzea ou das áreas de terra-firme.
Foto: Carlos Ramos
[1]
SCHAAN, Denise Pahl. O povo das águas e sua expansão territorial: uma abordagem
regional de sociedades pré-coloniais da Ilha de Marajó. Revistade Arqueologia,
n. 17, p. 13-32, 2004.
[2]
Souza, A. L. de. Evolução do Sistema Agrário da Mesorregião do Marajó: uma
perspectiva sócio-histórica. Disponível em: http://www.isssbrasil.usp.br/isssbrasil/pdfs2/tcms_4.pdf
[3] BOULHOSA,
M. da S. Entre a sela e o santo: um estudo sobre a identidade do vaqueiro
marajoara. Dissertação (Mestrado) Ciências Sociais – Universidade Federal do
Pará, 2007.
[4] Silva,
R.O da; Coelho-Ferreira, M.; Jardim, M.; Lima, P.; Menezes, L. de. Pesquisa de
Cadeias de Valor Sustentáveis e Inclusivas: Açaí. Instituto Peabiru,
2011. 64p. Documento Interno.
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