quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Lamberto, o Traumatizado: Seu Umbiguinho

Lamberto, o Traumatizado, ponderava com seu amigo-pai, Sábio Colares, os resultados das eleições municipais de 2016:

"Colares, você viu? Foram eleitos muitos prefeitos ricos e conservadores. Como se explica?".

 Sábio Colares contou-lhe uma estória.

"Conheci certa vez um homem conhecido por todos como Seu Umbiguinho. Morava lá pras bandas de Pucuruaçu, onde ocorrera mais uma eleição pra prefeito. Disputavam naquele ano os partidos PSAS (Partido Sou A Solução) e o PSdeN (Partido Sentimento de Nós) , um mais ligado ao poder econômico, outro vindo da luta da população por direitos básicos. No meio, o PDdoA (Partido Depende do Acordo). Umbiguinho era gari em um município em que os garis não eram valorizados, tanto nos salários, quanto nas condições de trabalho. Seu Umbiguinho conhecia o candidato do PSdeN, um professor também lascado como ele, que lutava pela educação, pelo meio ambiente e pela justiça aos professores e aos demais trabalhadores, inclusive para que a vida dos garis fosse digna.  Participavam sempre das mesmas passeatas. Reclamavam juntos por melhores salários. Até juntos receberam as mesmas pedradas dos filhos dos grandes comerciantes nos atos de protesto. Eram bons conhecidos. O candidato do PSdeN conseguiu a duras penas projetos para seu bairro. Água, luz, piçarra na rua, mesmo um bico extra de carreteiro de entulhos das casas conseguiu Umbiguinho a partir do esforço do candidato do PSdeN.  Estavam ali no movimento, iguais.

No dia da eleição, o candidato do PSdeN ficou em quarto lugar. O vencedor do pleito foi aquele do PSAS, que ficara com 35% dos votos.

Brancos/Nulos/indecisos somaram 35%.

O candidato do PDdoA com 25%.  

O professor com 5%.    

Refletindo sobre a derrota nas urnas ao passear no bairro, de pobreza espalhada e valas abertas a multiplicar as carapanãs, o candidato do PSdeN ficou encucado quando viu o imenso cartaz do PSAS na casa do Seu Umbiguinho. Guardou a dúvida pra si.

Quando a vida tomou realidade novamente, as mesmas lutas, as mesmas reivindicações, a labuta de sempre, lá estavam o professor e o seu vizinho gari no meio de uma caminhada reclamante. O professor aproveitou a ocasião e puxou conversa com Seu Umbiguinho: "Seu Umbigo, por nada não, mas eu vi um cartaz imenso do candidato do PSAS na porta da sua casa. Sei que o voto é secreto, mas diga pra mim, o senhor votou nele?". 

"Votei sim, professor".

"Mas eu ando junto contigo todos os dias, todos os anos, haja chuva ou sol pra que as coisas melhorem... Puxa, olha, não vou ficar com raiva não, viu? Só me explica porque o senhor votou no homem que nem liga pra gente, do PSAS. O cabra anda até com os comerciantes que mandam dar pedradas na gente!".

"Posso dizer? Na boa?".

"Pode".

"Ele foi lá em casa pedir meu voto. Já o senhor nunca foi. Me senti 'o cara', um patrão daqueles lá em casa pedir meu voto. Aí ele me ganhou...".



Sábio Colares perguntou a Lamberto: "o que tu tiras daí?".

Lamberto respirou fundo e disse: "Esse Seu Umbiguinho....".






Sem Traumas.









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