quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Habemus Status Quo: Caxiuanã



Belém, 30 de novembro de 2016.


O Serviço Florestal Brasileiro (SFB) assinou no dia 29 de novembro de 2016, contratos de concessão permitindo o manejo florestal sustentável em três unidades de manejo florestal (UMF) na Floresta Nacional do Caxiuanã, localizada nos municípios de Portel e Melgaço, no Pará[1]. Por conta das tragédias do dia, o acidente com o avião da Chapecoense e a Aprovação em Primeiro Turno no Senado Federal da PEC dos Gastos Públicos (PEC 55)[2], passou despercebida a notícia nas redes sociais em que participo. Por sorte, estava em Brasília com a Gerência de Florestas Comunitárias do Serviço Florestal Brasileiro no dia anterior e fiquei sabedor das novidades sobre Caxiuanã.

Novidades nem tão novas. Na verdade, Habemus Status Quo.

O Estado Brasileiro agiu mais uma vez como Não Nação. Apesar do pedido feito em carta por lideranças comunitárias da Floresta Nacional de Caxiuanã para maiores esclarecimentos sobre o processo de Concessão Florestal em curso[3] (a atividade florestal madeireira em Portel e Melgaço tem uma péssima fama naquela região paupérrima do Marajó pela pobreza que ajudou a espalhar), a resposta oficial dada pelo Serviço Florestal foi de que as audiências públicas já tinham cumprido este papel de explicar o que seriam tais concessões[4].

Tudo bem, de fato, as audiências do edital de concessão florestal ocorreram nas sedes municipais de Breves, Portel, Melgaço e Porto de Moz. Mas reparem, nas cidades e não dentro da Flona Caxiuanã. As comunidades agroextrativistas locais não receberam de maneira enfática e detalhada como tudo ocorreria e como aquelas localidades poderiam ganhar com isso. E eis que mais uma vez aconteceu o de “cima-para-baixo”, a indiferença institucional ao nativo, ao local, tudo acelerado, na maldita mentalidade para o Estado Brasileiro de que aqueles que vivem da terra são apenas um detalhe (muitas vezes um incômodo), não os protagonistas. Foi assinado um contrato oficial de exploração de madeira para empresas que passam a circular no local, enquanto que famílias moradoras da Flona Caxiuanã há pelo menos desde a sua criação nos anos 1960 não possuem um Contrato de Concessão de Direito Real de Uso. Revoltante!

Para o grande capital, o Estado assina e indica: “toma, usufrui”. Para o morador e moradora de gerações, precariados da água, da habitação, da segurança alimentar, da segurança da terra, da comunicação (existem comunidades de Caxiuanã que precisam de 12 horas de viagem de barco) e do uso dos recursos naturais o posicionamento foi: “já escutamos vocês na cidade. Ah, vocês não foram lá... bom, mas já fomos”.

Respeito muito o Serviço Florestal Brasileiro por sua importância fundamental no debate das políticas florestais, mas olha, como vem sendo executado o CAR sem uma ampla e participativa reflexão (no Pará uma ONG e o ITERPA discutem tecnicamente entre eles um novo sistema) e com o caso de Caxiuanã de não atendimento na íntegra do artigo sexto da Lei nº 11.284, de 2 de março de 2006[5], (devo estar enganado na minha interpretação) creio que uma repactuação é necessária urgente. Caso contrário, vejo a instituição perigosamente validar projetos que não nos ajudam e distanciam os conceitos de Estado e Nação Brasileira na sempre contraditória relação com a Amazônia.

O SFB nasceu para a gestão pública das florestas. Como vem procedendo? O quanto participamos enquanto sociedade do monitoramento de suas ações? É entidade pública ou estatal? A Floresta Amazônica será tratada como patrimônio público brasileiro por sua vez ou será tratada a partir de pontos-com disfarçados de estatal?  

Questiono-me.

(É isso que dá andar lendo As Veias Abertas da América Latina, de Eduardo Galeano. Eita!)




Pantoja Ramos





[4] Ofício número 72/ 2015 da GEFOC/ SFB/MMA.
[5] Art. 6º - Antes da realização das concessões florestais, as florestas públicas ocupadas ou utilizadas por comunidades locais serão identificadas para a destinação, pelos órgãos competentes, por meio de:
I - criação de reservas extrativistas e reservas de desenvolvimento sustentável, observados os requisitos previstos da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000;
II - concessão de uso, por meio de projetos de assentamento florestal, de desenvolvimento sustentável, agroextrativistas ou outros similares, nos termos do art. 189 da Constituição Federal e das diretrizes do Programa Nacional de Reforma Agrária;
III - outras formas previstas em lei.

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