Reunião na Mata do Rio Jaburu, em Gurupá, sobre o Uso Florestal da Andiroba. Foto: FASE. 2003.
14 Reflexões Para uma Nova Filosofia de Manejo
Florestal Comunitário e Familiar no Pará[1]
Belém, 13 de setembro de 2017.
Caríssimas e Caríssimos,
Na tentativa de contribuir com a Política de Manejo
Florestal Comunitário e Familiar do Estado do Pará, lanço a seguir algumas
reflexões naquilo que entendo ser fundamental de ser considerado neste novo
marco legal. Tais indicações surgiram a partir dos textos e experiências de campo
que me vem à mente nestes últimos 20 anos.
1ª Reflexão – é
preciso reconhecer que a floresta é algo múltiplo em seus usos e significados,
no equilíbrio real do que é ambiental, social e econômico segundo o que preconiza
o manejo florestal;
2ª Reflexão – Não
devemos falar somente da terra que sustenta uma Floresta como a Amazônica,
porém devemos nos dirigir aos territórios envolvidos e seus moradores, distintos,
complexos a desafiar positivamente a ciência para nos evoluir;
3ª Reflexão – As
Mulheres a Floresta possuem forte interação e é preciso que as políticas voltadas
para o manejo florestal reflitam isso;
4ª Reflexão - O
ordenamento territorial prévio à aprovação de planos de manejo florestal deverá
ocorrer de maneira a respeitar o que consagra o Estatuto da Terra e a Convenção
169 da Organização Internacional do Trabalho;
5ª Reflexão – é
preciso exercitar novas terminologias em substituição aos termos produtos madeireiros ou não madeireiros, que remontam à ideia se uma árvore deve ou não cair; dada
a sua importância para a vida, precisamos olhar os produtos florestais como
Bens e Serviços da Floresta (BSFs);
6ª Reflexão – é
necessário ter o entendimento que o manejo de açaizais nativos, de cipós, de
cascas, de óleos ou de sementes florestais tem o mesmo ou quem sabe maior valor
ao uso madeireiro da floresta; sair do puro extrativismo para o manejo florestal
comunitário e familiar destes produtos é alavancar a Amazônia para um novo
patamar civilizatório, de Bem-Viver e cidadão;
7ª Reflexão – Não
se deve permitir a aprovação de planos de manejo florestais madeireiros em
áreas comunitárias que tenham como método de extração a Unidade de Produção Anual
Única (UPA Única) ou de poucas UPAS, impedidoras da geração prontamente posterior
em usufruir os recursos florestais antes disponíveis; o ciclo de corte precisa
estar exigido nos planos de manejo madeireiros;
8ª Reflexão – É
necessário que instrumentos como Planos de Uso Comunitário dos Recursos
Naturais e Protocolos Comunitários estejam entre as condicionantes para emissão
da Autorização Prévia à Análise Técnica (Apat) de Plano de Manejo Florestal Sustentável
(PMFS); são ferramentas de comprovação de organização social para proteger a
natureza e os direitos dos povos da floresta;
9ª Reflexão – No
caso do manejo florestal comunitário e familiar madeireiro terceirizar suas
atividades operacionais, a comunidade deve ser a protagonista das decisões, responsável
direta por sua gestão e acompanhamento das atividades; recomenda-se que haja um
tempo de incubação (2 anos minimamente) para a formação das famílias em noções
básicas sobre o processo de manejo florestal madeireiro, suas responsabilidades
e a diferença de escala entre o volume trabalhado por uma empresa madeireira e
a escala de bem-viver que a comunidade deseja ou convive; que haja contrato
firmado entre as partes com acompanhamento do ministério público e defensoria
pública;
10ª Reflexão – é
mister que os municípios estejam participando dos processos de elaboração e
monitoramento das diversas formas de manejo da floresta e agrofloresta;
11ª Reflexão –
para cada ecossistema uma forma de manejo florestal que comprove a sua sustentabilidade
ambiental, sejam florestas de terra-firme, sejam florestas de várzea; apesar da
base científica de manejo florestal que detemos, esta ainda possui como preponderância
o pensamento do sul do país, EUA e Europa, não correspondentes à intrincada
realidade da Floresta Amazônica e da tecnologia tradicional de seus Povos;
12ª Reflexão – é
moralmente necessário que as casas das famílias onde se pratica o manejo
florestal comunitário madeireiro sejam dignas para comportar seus moradores; que
haja programas de aquisição de madeira manejada para destinação às famílias com
comprovada necessidade de moradia; uma mãe que habita no interior de Estado tão
rico de florestas nunca deveria morar numa casa que não protegesse seus filhos.
13ª Reflexão – A
educação florestal precisa ser incentivada a partir de centros de treinamento
em manejo florestal ou no apoio às comunidades tradicionais que funciona como
verdadeiras “escolas da floresta”; a educação florestal não pode ficar restrita
somente nas universidades e institutos federais: precisa chegar à escola
fundamental e média, não com peso técnico, mas sobretudo para ofertar o
conceito de que a floresta é um bem comum aos brasileiros, consagrado no artigo
2° do Código Florestal Brasileiro;
14ª Reflexão - Toda política objetiva cuidar com zelo daquilo
que é bem de todos, conceito valioso segundo Mahatma Gandhi. O Manejo Florestal
Comunitário e Familiar precisa de uma Política e de homens e mulheres que a
construam!
Estas foram as minhas
contribuições.
Cordialmente nesta “Florasofia”,
Carlos
Augusto Ramos[2].
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