Belém, pensando em
Portel, 19 de maio de 2022.
Esta será uma crônica incompleta,
desde já aviso. Sua intenção é apenas ser uma flor. Uma homenagem jogada para
sempre em favor de Manelzinho, aquele que não pude conhecer, mas cuja partida
me socou por dentro. Escrevo neste ato concreto
de digitar as letras para que ao rodar nos meios virtuais, possa sensibilizar
alguém que imprima tal texto e quem sabe, trazer nossa atenção para o mundo
real.
Mundo real que viu partir Manelzinho,
o eterno garoto que veio a este plano na forma de pessoa com deficiência, com
limitações para comunicar à nossa mediana civilizatória seus sonhos e vontades;
incômodos e dissabores; vislumbres e reflexões. E pelo que vi de sua foto,
sabia comunicar-se ao sorrir com os olhos e como é bonito ver gente assim: que
sorri pelos olhos!
Nas almas boas que captei em mensagens
de condolências, li a sinceridade do descrever do abandono, discriminação,
exclusão e até hostilidade que sofrera Manelzinho, mergulhado no rio etílico
ofertado por aqueles não o compreendiam. Em se falando de compreensão, lanço meus
sentimentos profundos para a avó de Manelzinho, dona da luta tamanha em cuidá-lo,
que não é fácil, aliás, é tarefa duríssima onde só o amor pode contar em
segredo de onde surge a força para continuar a caminhada.
E pensando bem, esta crônica precisa
ser uma roseira, com espinhos para espetar a sociedade que não se alertou do quanto
Manelzinho chamava “papai” em busca talvez de uma orientação, de um guarda, de
um guia, sei lá, não é isso que procuramos no firmamento quando nos defrontamos
com a insegurança, o medo, a dúvida? “Pai”? Não é o que chamamos? Pois
Manelzinho assim procurava e nós ignoramos.
No fim, trágico acima de tudo,
implacável em primeiro pensamento, Manelzinho foi atropelado pelo caminhão do
lixo da cidade, veículo que não é de correr muito e apesar disso, traz consigo todo
o peso da sujeira que produzimos, todo o descarte que consideramos.
E o caminhão do lixo matou
Manelzinho, muitas vezes descartado.
Não sendo eu uma pessoa que costuma rogar, pecador que sou, não posso desta vez deixar de implorar pelas pessoas de Portel, do Marajó e da Amazônia, que como Manelzinho, precisam de proteção da família, de cuidados da saúde pública, de educação inclusiva, de acompanhamento profissional para que possam dizer do seu modo o que sentem. Falo de Dignidade.
Deposito esta crônica em forma de flor, Manelzinho. Que tu
descanses em paz.
E depois que acordares, que possas brincar céus afora com seu Papai.
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